Arquivo do mês: abril 2011

Razão para Escrever

“Escrever e ler fabrica tempo. Nos dá todas as vidas que nos faltam, as lembranças que não temos. Converte nossa mortalidade inevitável em algo estético”, Andrés Neuman respondendo à indagação sobre o porquê de escrever tanto.(Ilustrada, Folha de São Paulo, 30.04.2011)

SITUAÇÃO ESTRUTURAL E CONJUNTURAL DO MARANHÃO

(Extraído do PPA 2008-2011, Seplan, 2007, Governo do Maranhão, elaboração coordenada por Raimundo Palhano, ex-Presidente do Imesc)

1 Antecedentes Históricos

Os espanhóis foram os primeiros europeus a atingirem as terras do Maranhão, isto em1500. Aprimeira tentativa portuguesa, fracassada, de ocupação do território data de1535. Aocupação efetiva só se deu em 1612, quando 500 franceses, embarcados em 3 navios, fundaram um núcleo de povoamento chamado França Equinocial e um forte a que denominaram de São Luís, em homenagem ao rei Luiz XIII, tendo sido expulsos em 1615, pelos homens de Jerônimo de Albuquerque, sob bandeira lusitana, na Batalha de Guaxemduba.

O Brasil Colonial foi divididoem dois Estados, em 1621, por Felipe IV da Espanha, sendo o Estado do Maranhão e Grão-Pará um deles. O objetivo era melhorar a defesa da costa e da região amazônica e facilitar o contato com Portugal, pois o relacionamento com Salvador era dificultado pelas correntes marítimas, uma vez que a referida capital encontrava-se localizado na costa leste do oceano Atlântico e as embarcações não conseguiam atingi-la saindo do norte, por falta de tecnologia apropriada.

Entre 1641 e 1644 o Maranhão foi invadido pelos holandeses, que se instalamem São Luís, expulsos por Antonio Teixeira de Melo, na Batalha do Outeiro da Cruz.

A reunificação do Brasil Colônia deu-se no início da segunda metade do século XVIII, quando o domínio português já estava consolidado na região como um todo. O longo período de isolamento do Maranhão em relação ao restante do Brasil produziu várias conseqüências para a sua formação social, destacando-se o tardio desenvolvimento de sua economia colonial e a forte identificação com Portugal, a ponto de só aderir à Independência mediante intervenção armada, isto em 1823.

Até o período da reunificação a economia do Maranhão manteve-se à base da produção de açúcar, cravo, canela e pimenta. Basta dizer que só em 1748 é autorizada a circulação de dinheiro amoedado de ouro, prata e cobre, em substituição aos rolos de algodão.

A partir da segunda metade do século XVIII, com a introdução da Companhia Geral de Comércio do Maranhão e Grão-Pará, iniciativa do Marquês de Pombal, no reinado de D. José I, é que a economia colonial maranhense assumiu relevância, produzindo algodão, arroz e mais tarde, já no século XIX, cana-de-açúcar, produtos de larga valorização à época.

Estes produtos constituirão a base da economia maranhense até o final do século XIX, toda ela estruturada no trabalho escravo, como de resto no Brasil.

O objetivo da CGCGPM era transformar o Maranhão em uma colônia tropical clássica e para isso possuía dois monopólios decisivos: o do transporte e o do comércio externo. Centrada nas culturas do algodão, do arroz e das especiarias amazônicas, no caso, anil, urucu, gengibre, urzela, dentre outras, além do impulso que deu às exportações do bicho da seda e de couros, teve vida curta, extinta em 1781, com a ascensão ao trono de D. Maria I, embora tenha sido responsável por uma das fases expansivas mais importantes da economia maranhense, correspondente ao período 1755-1888. Na verdade, lançou as bases do notável surto de desenvolvimento das quase cinco décadas seguintes, indo até às primeiras décadas do século XIX. São Luís chegou a ter entre 100 e 150 navios por ano no porto e exportava ao redor de 1 milhão de libras, quase um terço das exportações do Brasil. O certo é que a grande lavoura e o trabalho escravo fizeram do Maranhão uma das áreas mais ricas do Brasil, tornando São Luís, com 30.000 habitantes em1822, aquarta cidade brasileira, atrás apenas do Rio de Janeiro, Salvador e Recife.

A mentalidade dos beneficiários da riqueza, representados por algumas centenas de senhores de terras e comerciantes era outra, todavia. O projeto cultural dessas elites baseava-se no transplante da civilização européia. Símbolos disto: sobradões de paredes duplas, fachadas de azulejo, criadagem numerosa, filhos doutorando-se em Coimbra e assimilação dos gostos e modas européias_ mobiliário, alfaias, baixelas, trajes, comidas, bebidas e lazeres.

Muitas filhas dessas elites recebiam aulas de pianoem francês. Coma Independência, alguns mais abastados ganharam até status de nobreza, transformando-se em barões do Império. Foi justamente dessa elite próspera que saíram os poetas, os juristas, os políticos e os eruditos, responsáveis pela aura de distinção cultural da Província, que se sedimentará mais adiante levando ao mito de Atenas.

A abolição da escravatura, em 1888, levou o estado a enfrentar um longo período de decadência, refluindo em algumas regiões à era da cubata, no dizer de Ignacio Rangel, penetrando o século seguinte, indo até seus meados, quando inicia um novo ciclo, agora caracterizado por sua inserção na nova divisão do trabalho que ocorre no país, sob a liderança da industrialização do sudeste, em especial de São Paulo.

Este longo período de decadência só não foi maior por força de um parque fabril têxtil que se instalou no estado entre fins do século XIX e as primeiras décadas do século XX, o qual entra em declínio mais adiante, entre outras razões pela falta de inovação tecnológica, modernização e de visão empresarial. Além disso, as poupanças acumuladas no estado não foram investidas nas atividades produtivas locais e sim em outros mercados, especialmente o imobiliário, no Rio de Janeiro, o que representou um bloqueio ao desenvolvimento das atividades industriais e agrícolas.

A partir de meados dos anos 50 do século passado teve início um novo processo de acumulação capitalista no país, baseado na concentração de capitais no sudeste. Ali se implantou um processo de industrialização centrado nas indústrias de bens de consumo duráveis e posteriormente de bens de produção. As economias regionais do Brasil, como a maranhense, tiveram que se rearticular e adaptar a essa nova organização produtiva. O Maranhão passou então a cumprir o papel de área complementar de acumulação do sudeste, fato indutor do processo de desarticulação da tradicional economia local, atingindo mortalmente o setor têxtil. Para garantir a consolidação do novo modelo foi desenvolvida uma infraestrutura que terá um papel preponderante na nova configuração econômica do pós anos 1950.

O modelo de desenvolvimento então pensado pela SUDENE, posicionou o Maranhão como receptáculo de populações nordestinas fugidas da seca e da falta de terras. Isto faz ressurgir a agricultura como atividade principal da economia, praticada em vastas extensões de terras, até então considerada devolutas. Não houve nenhum processo produtivo inovador ou tecnologicamente avançado, simplesmente um vasto movimento  de assentamentos populacionais. A rigor a economia passou a depender dessas atividades agrícolas e extrativas, que não obedeceram, em seu processo de implantação, a nenhum critério de racionalidade e planejamento econômicos. Rapidamente o Maranhão se transformou em área de reserva capitalista, estimulada pelos incentivos fiscais, que atraíram para a região os capitais excedentes acumulados no centro dinâmico da economia.

O paradoxo da economia maranhense reside no fato dos investimentos infraestruturais não terem provocado taxas de crescimento do produto em níveis satisfatórios e sobretudo desenvolvido as cadeia de produção.  Considerando o período1939 a1970, aparticipação do PIB estadual em relação ao brasileiro permaneceu ao redor de 0,6%, com resultado um pouco inferior neste último ano. No início dos anos80, aparticipação era igual à de 1970. Os dados mais recentes apurados sobre o PIB estadual, em torno de R$ 20 bilhões em 2004, mostram que a participação maranhense gravita ao redor de 1%, sobretudo motivada pelo peso do setor público e do setor exportador de commodities minero-metalúrgicas e de grãos de soja.

A explicação mais plausível para o fenômeno está na quase inexistente agregação de valores à produção pela economia local, tanto em relação aos setores dinâmicos, como minero-metalúrgico e agronegócio da soja, como em relação aos setores tradicionais ligados à agropecuária e à agricultura familiar. Pela incapacidade de agregação do sistema, o produto econômico não gera valores capazes de incrementar investimentos e acumulação de excedentes. A conseqüência principal é a transferência de renda para outras economias, materializada numa balança comercial cujos termos de troca se encontram altamente deteriorados, se se compara a economia estadual como um todo.. O abastecimento interno, em decorrência disso, é quase todo feito por outros mercados, muitos deles bem distantes da base geográfica local.

Os grandes projetos agropecuários e minero-metalúrgicos que vieram para o Maranhão a partir de meados dos anos 70 e passaram a operar concretamente no início dos anos 80, apesar do volume de investimentos, em função da fraca integração às economias tradicionais locais, também não contribuíram para reverter esta situação.

O quadro de hoje delimita duas dimensões da economia maranhense: a dos grandes projetos, voltadas para os mercados globalizados, claramente enclavistas, e as outras economias, em geral pequenas, muitas de cunho familiar, com baixíssima densidade tecnológica e de geração de excedentes.

O desafio que se coloca no presente é o do estabelecimento de novos marcos regulatórios pelo planejamento do desenvolvimento do Maranhão.

Sem um projeto de desenvolvimento sustentável, construído e operado pelo governo, sociedade e setor econômico, tendo como alvo a superação da pobreza e o bem comum da população, não haverá a menor chance de modificação dos atuais parâmetros da economia local.

Projeto em que fique explicitado o papel do planejamento público como indutor das políticas de desenvolvimento agrícola, pecuário, industrial, comercial, de serviços e do mercado externo. Por falta dessa presença, as decisões sobre os investimentos no Maranhão são cada vez mais tomadas diretamente pelas empresas individualmente, sendo o setor público, em boa parte dos casos, simples associado menor.

2 Aspectos demográficos

A população estimada do Estado do Maranhão é de 6.184.538 habitantes(IBGE,2006), distribuída nos seus 217 municípios em 59,5% na área urbana e 40,5% na zona rural.

Considerando o período 1950-2004, observa-se que a situação de domicílio da população residente foi predominantemente rural, evoluindo de 82,68% aos 40% projetados para os anos recentes.

Estima-se que só em1996 apopulação urbana ultrapassou a rural.

Os números dos últimos 30 anos mostram que houve um equilíbrio de gênero, com ligeira vantagem para o contingente feminino(50,88% em 2004).

Representa 3,3% da população brasileira, sendo o 10o  Estado em termos populacionais. O crescimento médio anual da população na década dos 90, medida a partir do Censo de 1991( 4.930.253 habitantes ) corresponde a 1,94%, levemente superior à nacional, apurada em 1,63%.

Dados recentes, relacionados à cor ou raça, apresentavam a seguinte composição: Pardos 72,6%, Brancos 22,6%, Pretos 4,4% e Indígenas 0,4%.

A densidade demográfica obtida no último Censo corresponde a 16,91 habitantes/km2.

Com uma área total de 331.983,293 km2 ( 3,9% da área brasileira ) e localizado a oeste da Região Nordeste, o Maranhão é o 2o  maior Estado da Região e o 8o maior do Brasil.

Divide-se em 217 Municípios, espalhados em 5 mesorregiões geográficas, que se dividem em 21 microrregiões e em 32 regiões administrativas adotadas pelo sistema de planejamento estadual.

3 Atividades econômicas

 

O território maranhense encontra-se fora do polígono das secas, situando-se numa zona de transição entre o Nordeste semi-árido e a Amazônia tropical.

As atividades produtivas estão estruturadas em três grandes adensamentos, que formam os principais subespaços de desenvolvimento estadual, a saber: O Subespaço Costeiro, o Subespaço Cocais e o Subespaço Cerrado. O primeiro é o que concentra as principais atividades econômicas, administrativas, a infraestrutura, o comércio e os serviços modernos. Seu dinamismo contrasta com a situação observada nas outras áreas, onde predominam a estagnação econômica e grandes extensões de pobreza.

Os Cocais se caracterizam pelo predomínio das atividades agrícolas, pecuárias, florestais, com alguns municípios mais constituídos por força dos antigos investimentos estaduais e federais, uma vez que é a região de ocupação mais antiga.

O Subespaço dos Cerrados, mais ao sul do Estado, tem se especializado na produção de grãos, com destaque para a soja.

A região costeira e a dos cerrados  estão posicionadas na rota de passagem dos fluxos nacionais e internacionais, na área de influência do eixo Araguaia-Tocantins, materializados em commodities como minérios, alumínio, bauxita, soja, entre outras e se beneficia dos investimentos do governo federal em criação de infraestruturas e logística.

O PPA 2008-2011 tem na dinamização da economia um dos seus eixos fundamentais. Tornou-se impraticável a convivência com uma realidade econômica marcada pelo atraso, incapaz de elevar a produtividade setorial, a despeito dos investimentos que foram feitos na agropecuária, na indústria e nos serviços ao longo das décadas.

O diagnóstico existente aponta como causas do atraso econômico do Maranhão a baixa qualificação da força de trabalho, principalmente a que se encontra no interior do estado; a quase inexistência de assistência técnica e difusão tecnológica e, sobretudo, a incipiente capacidade de agregação de valores aos bens primários produzidos.

A situação é de tal modo preocupante que mais de 80% do abastecimento da população é feita com bens e serviços vindos de outros estados, com destaque para São Paulo, incluindo-se também o Piauí dentre os mais importantes abastecedores.

O desafio é tornar relevantes para o PIB estadual as várias economias existentes no estado, como a piscicultura, a carcinicultura, a pesca, a caprinocultura, a fruticultura, a apicultura, a floricultura, o setor sucro-alcooleiro rural, o setor sucro-alcooleiro agroindustrial, a produção de grãos de modo geral, além de outras economias como a bovinocultura, a geração de tecnologias, o reflorestamento, o meio ambiente, a economia do turismo e da cultura e os setores estratégicos da indústria em geral, do comércio e dos serviços modernos.

Por mais simples que possa ser, em função deste atraso relativo, as ações de dinamização econômica terão que começar por uma espécie de política de substituição de importações, dados os termos de troca da economia maranhense.

Apesar da expressão relativamente reduzida no PIB, tanto por força das “evasões”, como pela baixa agregação de valores, a agricultura é a principal atividade econômica do estado. É uma atividade por todos considerada atrasada, arcaica, pois em sua maioria ainda utiliza o sistema de roça de herança indígena, à base de técnicas, recursos e instrumentos considerados rudimentares.

O diagnóstico aponta que, pela falta de foco das políticas, pela dispersão dos recursos, pela inexistência de um planejamento do desenvolvimento dotado de poderes e pela ausência de um projeto para o Maranhão que priorize o bem comum do povo, as forças produtivas locais não ultrapassaram o estágio produtivo primário, fato que contribui claramente para a situação atual, onde a população se vê cada vez mais privada de meios de reprodução, quadro este que se reflete nos baixos indicadores sociais de desenvolvimento.

Apesar de alguns grandes projetos industriais, voltados à exportação, localizados na Capital e em alguns municípios da pré-amazônia maranhense e de apresentar, nos últimos anos, taxas de crescimento industrial elevadas (indústrias metalúrgica, alimentícia, madeireira e têxtil), em especial os 10,3% de 1988, considerada a mais elevada do país; e de outros, também modernos, vinculados ao setor agropecuário( soja e pecuária de corte ), na parte sul do estado; a economia maranhense caracteriza-se, sobretudo, pelo extrativismo e pequena produção agrícola( cana de açúcar, mandioca, arroz, babaçu, pesca artesanal ), sob métodos produtivos primitivos ou de baixíssima tecnologia, voltada, em boa parte, à subsistência, operada em uma das estruturas fundiárias das mais concentradas do país; e pela forte participação do setor terciário, onde se destaca o papel proeminente do segmento governamental, responsáveis, estes dois últimos, pela absorção da maior parte da população economicamente ativa.

O PIB maranhense, no contexto do Nordeste, em média, conforme dados de 2004, era 5 vezes menor que o da Bahia, 3 vezes menor que o de Pernambuco e 2,5 vezes menor que o do Ceará. Essa soma de bens e serviços produzidos no ano, gerava uma renda per capita de R$ 1.337,00 no Maranhão, a segunda mais baixa do país, superior apenas à do Piauí, e bem abaixo da renda per capita nacional, correspondente a R$ 5.860,75.

É um dos Estados de maior concentração de renda do país. Seu índice de Gini ( que mede a concentração de riqueza, indo de0 a1 ), segundo dados recentes, equivale a 0,600, situava-se bem próximo dos dois Estados mais desiguais do Brasil, no caso Paraíba  ( Gini de 0,644 ) e Piauí ( Gini de 0,609 ).

A renda média mensal dos 40% mais pobres no Maranhão, no início do ano 2000, correspondente a R$ 72,20, era inferior à do Nordeste( R$ 79,28 ) e mais ainda em relação à brasileira ( R$ 127,27 ). Com tal nível de renda, o referido extrato social percebia por dia de trabalho o correspondente a R$ 2,41 ou R$ 0,30 por hora trabalhada. Ainda entre os 40% mais pobres, cerca de 3% não percebiam renda alguma.

A proporção da população ocupada, por renda familiar per-capita de até meio salário mínimo, conforme a PNAD, no Maranhão, em 1999, correspondia a 52,9%, acima dos 34,3% de 1992 e bem mais alta que a observada para o Brasil, igual a 18,9%. O percentual de famílias, com renda de até meio salário mínimo, segundo a mesma fonte e em igual período, totalizava 49,1%, acima dos 35,8% atingidos em 1992 e distante do número nacional, no caso 20,1%.

Nestes dois últimos indicadores, o desempenho maranhense atingiu os piores patamares do país. Dados de 1998, também do IBGE, revelavam que os 57,8% da população ocupada do setor primário se apropriavam apenas de 10,7% da renda interna; que os 8,2% da população ocupada do setor secundário, de 23,3%, e que os 33,6% da população ocupada do setor terciário absorviam 66% da mencionada renda interna. No mesmo ano, a população urbana, estimada em 43% da população total, detinha 89,3% da renda, enquanto a população rural, estimada em 57% da população total, se apropriava de apenas 10,7%. A composição do PIB maranhense no ano de 2004, de acordo com o IBGE, era a seguinte: Agropecuária 13,9%, Indústria 27,1% e Serviços 59%.

4 Infraestrutura social

4.1 Problemas Sociais

O balanço, feito pelo IBGE, dos anos90, apartir do estudo “Indicadores Sociais2000”, situa o Maranhão como um dos três Estados brasileiros com menor desenvolvimento social, por apresentar um dos piores desempenhos nos indicadores sociais ao longo da década, superado apenas por Alagoas, o primeiro, e Piauí, o segundo.

A taxa de analfabetismo das pessoas com 15 anos e mais, no Estado, equivalia a 28,8%( em 1996 era de 33,12% ), bem mais elevada que a brasileira, de 13,5%. Na referida unidade federada, a taxa de analfabetismo funcional correspondia a 52,8%( em 1998 apresentava a mais elevada taxa do país, igual a 56,7%, segundo o MEC ), significando dizer que 5 em cada 10 moradores eram analfabetos funcionais, ou seja, estudaram menos de 4 anos e só sabem escrever o nome.

Segundo a PNAD de 1999, na distribuição da taxa de analfabetismo por raça ou cor, 21% eram pretos, 19,6% pardos e apenas 8,3% brancos.

A mortalidade infantil no Maranhão atingiu 60,27 crianças de cada 1.000 nascidas vivas( índice que situa o Estado no 4o pior lugar ), bem acima da taxa brasileira, de 36,1;  e a mortalidade das crianças de menos de 1 ano, por causas mal definidas, chegou a 20,5%, mais elevada que a atingida em 1992, igual a 17,5%, conforme a PNAD 1992/1999.

Pelos dados do UNICEF, em 1999, era bem elevado o índice de desnutrição entre crianças até 5 anos, a ponto de dois Municípios maranhenses, no caso Afonso Cunha e Nina Rodrigues estarem entre os 10 Municípios brasileiros com maior índice de crianças desnutridas, com taxas próximas de 36%.

Segundo o Ministério da Saúde, a maior parte da população não tem acesso a saneamento básico, a ponto de apenas 15,4% dos moradores da zona rural contarem com esgotos sanitários.

Segundo a PNAD de 1999, era de 58,9% o percentual de domicílios abastecidos por meio de água encanada, enquanto no Nordeste atingia-se 80,9% das residências.

O desempenho do setor educacional também exigia atenção redobrada. A área da educação infantil, que cobre a faixa de0 a 6 anos, passa por grandes dificuldades, principalmente quanto à oferta de creches públicas, onde a carência é generalizada. De acordo com a publicação “Situação da Infância Brasileira2001”, do UNICEF, em 1999, o Maranhão tinha 506.861 crianças na faixa de0 a 3 anos. Considerando-se que o atendimento desta faixa em creches públicas correspondia a 3,43%, vê-se o quanto ainda precisava ser feito pelo setor público maranhense. Mesmo sendo bem mais elevada a taxa de matrícula na pré-escola, igual a 51,24%, muitas novas vagas precisam igualmente ser abertas para atender o contingente de crianças na faixa de4 a 6 anos, igual a 402.074.

O ensino fundamental, embora ostente uma taxa líquida de matrícula ( 95,24% ) quase igual à nacional, de 97,4% na faixa de7 a14 anos, apresentava uma elevadíssima taxa de defasagem idade/série, superior a 45%, a ponto de, dentre os 1.634.218 alunos matriculados, quase 1.000.000 corresponder a estudantes em situação de percurso retardado.

Segundo o Censo Escolar, em1999, adefasagem idade/série de crianças de 14 anos era de 92,7%. O ensino médio, além da grande defasagem idade/série, que levou o Governo estadual a contratar o Telecurso 2000 da Fundação Roberto Marinho para liberar, em 13 meses, cerca de 150.000 alunos defasados, de um total de matrículas ao redor de 200.000 em todo o Estado, enfrentava um outro desafio, representado por uma forte demanda por novas vagas para atender à crescente procura das áreas urbanas e mesmo rurais.

Tomando-se por base os dados do Censo Escolar, em1999, ataxa de escolarização líquida era de apenas 17% e a taxa bruta equivalia a 46%. A despeito de ser o nível de ensino que mais cresceu( incremento médio anual de 11,5% )em termos de aumento de alunos, nos últimos anos, vê-se o quanto ainda precisa ser feito para que se eleve a taxa de escolarização líquida do ensino médio maranhense. Em 1998, conforme o INEP/MEC, a taxa de evasão era de 6,1%, a de reprovação de 13,1%, a de abandono de 15,5% e a de repetência de 30,9% no ensino fundamental, enquanto a taxa de evasão era de 7,7%, a de reprovação de 7,4%, a de abandono de 16,1% e a de repetência de 19,2% no ensino médio.

O ensino superior, pela avaliação do “Provão”, apresenta desempenho sofrível. Dos 49 cursos de graduação da UEMA, a maioria deles obteve notas “E” e “D”, de onde também não escapa a maior parte dos cursos da UFMA.

Estudo do UNICEF e do Governo Estadual, analisando o desempenho da educação básica maranhense nos anos 80, revela que do total de matrículas na 1a Série, apenas 12,1% concluíam o ensino fundamental e precisavam de 8,8 anos para concluí-lo. O panorama para os alunos da escola rural era dramático: ao redor de 3% chegavam à 8a Série, passando mais de 10 anos para isso. Em média, naquela década, de cada 1.000 alunos que entravam no sistema, apenas 55 se formavam em 8 anos e 66 em mais de oito. Nada menos que 50% abandonavam a 1a Série e apenas 22% atingiam a 4a Série. Mais de 68% das matrículas anuais eram destinadas a cobrir necessidades dos que iriam ser excluídos da rede de ensino( 57,1% ) e dos repetentes( 11,1% ).

Na década, o sistema de ensino gastava 25 matrículas-ano por cada aluno formado, quando a relação aceitável equivale a 8 ou, no máximo, 9. Uma das características básicas desse sistema era a sua incapacidade de “reter” o aluno, de assegurar a sua inclusão permanente.

Dois indicadores, por fim, sintetizam bem o quadro de pobreza e de desigualdade sociais vigentes no território maranhense. O primeiro diz respeito ao IDH, originalmente desenvolvido no âmbito da ONU, que leva em conta a expectativa de vida ao nascer, o grau de escolaridade e a renda per capita da população; e o segundo refere-se ao IDI, construído pelo UNICEF/Brasil, ( lastreado nas principais variáveis que informam a TMM5- Taxa Média de Mortalidade de Menores de 5 Anos, considerado por aquele Fundo seu principal indicador de bem estar da infância no mundo ), e que incorpora aspectos do conceito de desenvolvimento infantil e enfoques de direitos humanos presentes na doutrina da proteção integral contidas na Convenção sobre os Direitos da Criança e no ECA, leva em consideração o percentual de crianças que dependem de mães e pais com escolaridade precária, a cobertura vacinal, a cobertura pré-natal, a taxa de escolarização bruta em creches e pré-escolas, entre outras.

O IDH do Maranhão, em 1997 e 1998, era, respectivamente, 0,547 e 0,512, enquanto o brasileiro atingia 0,739 e 0,797. Em 1997, com esse índice, o Brasil ocupava a 74a posição no mundo em termos de desenvolvimento humano. Em igual período, em nível bem abaixo do índice médio nacional, o IDH maranhense era o terceiro menor do país, inferior apenas ao Piauí( 0,534 ) e Alagoas( 0,538 ).

O IDI do Estado do Maranhão, calculado com base em dados de 1999, era de 0,455, enquanto o brasileiro totalizava 0,539, ambos distantes do mais elevado índice atingido no país, o do DF, igual a 0,673.

Pelo levantamento, o Maranhão ficou com o 24o IDI do Brasil. Dos 217 Municípios maranhenses, 140 ou 64% do total, possuíam IDI de até 0,399. O Estado abriga em torno de 1.000.000 de crianças na faixa de0 a 6 anos. O desempenho do IDI maranhense revela a monumental obra que terá que ser feita hoje para garantir uma melhor qualidade de vida para sua infância e um futuro menos sombrio para as próximas gerações.

SOBRE CÉLIA LINHARES

(Entrevista concedida em 2007 à Adrianne Ogêda Guedes, com vistas à sua tese de doutorado em Educação pela Universidade Federal Fluminense)

Caro Professor Raimundo Palhano,

Me chamo Adrianne Ogêda Guedes, doutoranda da Universidade Federal Fluminense.

Estou desenvolvendo uma tese de doutorado, na Universidade Federal Fluminense orientada pela professora Iduina Chaves, sobre a influência e importância da professora Célia Linhares no pensamento pedagógico brasileiro.

Para isso estou entrevistando pessoas que, de algum modo, estiveram próximas a ela em diferentes momentos de sua trajetória. A própria professora Célia foi quem indicou seu nome.

Essa entrevista tem como objetivo apreender diferentes olhares sobre o ideário pedagógico da Professora Célia, bem como buscar elementos históricos presentes em suas experiências profissionais que reflitam sua contribuição e participação em distintas esferas da Educação Brasileira.

Nesse sentido, peço sua contribuição comentando as questões abaixo;

1)      Em que contexto e época conheceu a professora Célia Linhares?

Foi no ano de 1984, quando iniciei o mestrado em História, na UFF, no Rio de Janeiro, por intermédio de minha esposa, colega de Célia na profissão e também de Universidade Federal do Maranhão, isto desde a fase pré-ditatorial. O regime autoritário, poucos anos após sua implantação, a levará e ao seu marido, o genial José Ribamar Linhares, a buscarem asilo voluntário fora de São Luís, precisamente no Rio, temerosos de perseguições políticas dos militares no poder, em função de suas atuações militantes nos movimentos eclesiais de base liderados pela Igreja Católica.

Queimados os navios ludovicenses, Célia e seu companheiro começam do marco zero uma nova jornada, onde irão, com muita tenacidade e ternura, lapidar os diamantes que traziam na alma, investindo em suas formações acadêmicas e profissionais, no Brasil e no exterior; ele tornando-se um executivo de nível internacional e ela a intelectual e pesquisadora exponencial que tanto admiramos.

2)      Comente sobre as experiências profissionais que vivenciou com ela, destacando de que forma ela contribuiu nas mesmas e relatando alguma passagem especialmente marcante que tenha vivido com ela.

Vivenciei com Célia Linhares pelo menos três importantes experiências profissionais. A primeira e mais profunda ocorreu entre os anos 1997 e meados de 1999, quando ocupei o cargo de Secretário de Educação do município de Caxias, no Maranhão e Célia concebeu e coordenou o projeto político-pedagógico da educação municipal. A segunda, ocorrida no início dos anos 2000, relaciona-se ao desenvolvimento do projeto Escola Compartilhada, no município de Coelho Neto, também no Maranhão e a terceira experiência, esta mais recente, em São Luís, capital do estado, onde Célia implantou e desenvolveu o projeto Escola Sonhos do Futuro.

Em todas elas a contribuição de Célia foi marcante. Apesar dos títulos e da enorme bagagem intelectual e cultural, jamais fez desses atributos mecanismos de superioridade e arrogância; pelo contrário, soube conquistar os grupos locais, geralmente desconfiados e inseguros, levando-os rapidamente a atitudes de autodeterminação em seus trabalhos pedagógicos.

A experiência de um projeto instituinte de educação em Caxias, o da Escola Balaia, concebido e coordenado por ela, produziu naquela comunidade um impacto cultural muito forte, tendo ultrapassado as fronteiras do município e chegado mesmo a outras regiões, tanto pelo seu caráter inovador, como pelas mudanças que produziu em um sistema de ensino municipal que se caracterizava pela mesmice e pela falta de perspectivas.

A experiência de Coelho Neto inscreve-se como desdobramento da experiência anterior, interrompida prematuramente em decorrência de crises políticas locais. Ali Célia liderou um processo ambicioso de institucionalização de um sistema de ensino local, que objetivava tornar-se um ente federativo autônomo em termos de gestão administrativa e pedagógica. O trabalho de Célia foi, sobretudo o de conceber e instituir um programa de formação de professores que levasse aquela comunidade educativa a assumir plenamente a educação municipal. Embora também tenha sido interrompido antes da hora, novamente por conflitos de poder e de temor político, a experiência da Escola Compartilhada repercutiu muito bem, pois sairiam do meio daqueles  professores capacitados pelo projeto os novos dirigentes da educação municipal e que até hoje se mantêm articulados.

Não tive o privilégio de acompanhar de perto a experiência da Escola Sonhos do Futuro, em São Luís, pois não cheguei a integrar a equipe. Todavia sempre estive atento aos movimentos do projeto e compartilhava com Célia Linhares as minhas observações e recolhia dela os comentários e juízos sobre os enormes desafios que enfrentou e soube superar com maestria. Durou a experiência o tempo da sua contratação pela Prefeitura de São Luís, mas, como as demais, deixou marcas consistentes no professorado da capital, sobretudo no sentido de torná-los protagonistas ativos em suas atividades pedagógicas.

Devo dizer, por fim, em consideração à sua pergunta, que é impossível tentar identificar apenas uma passagem marcante da convivência com Célia. Com Célia Linhares não há passagens, há viagens.

3)      O que você destacaria com as idéias mais fortes no pensamento pedagógico de Célia Linhares?

O pensamento pedagógico de Célia Linhares é um composto que envolve arquitetura e fundamentos. Na dimensão arquitetural destaco o engenho e a arte com que constrói, com que elabora sua escritura e o seu discurso sonoro, o áudio de sua fala.

Há uma sensação de que a cabeça da autora não descansa nunca, que se entrega de corpo e alma à paixão pelo ato criador. Quando escreve ou quando discursa Célia encanta porque compartilha com os outros uma nova estética do ser, incomum, invulgar, colhida e recolhida a todo o momento dos materiais da vida, que suas mãos de artista selecionam e ressignificam como poucos.

O outro composto, o que envolve a dimensão filosófica, teórica e metodológica, emerge de modo sólido, sem superficialidades e concessões, vindo associado a uma cultura humanista ampla e sintetizadora ao mesmo tempo, que dão aos seus escritos o rigor da ciência e a singularidade da beleza literária.

Sua cultura acadêmica é vastíssima, fato que a torna conhecedora dos clássicos do pensamento universal e do pensamento pedagógico, sejam nacionais ou estrangeiros. Mergulha fundo em autores como Anísio Teixeira, Fernando de Azevedo, Jean Piaget, Jean Jacques Rousseau, Emilia Ferreiro, Vygostsky, Antônio Nóvoa, Althusser, Durkheim, Mirkhail Barkthin, Skinner, Bourdieu e Passeron, entre tantos outros da literatura pedagógica e filosófica.

Segundo o que tem revelado ultimamente, os autores que mais a têm ajudado nos estudos sobre a realidade são Walter Benjamim, Paulo Freire e Michel Foucault, além de outros como Humberto Maturana, Boaventura Santos, Marie-Christine Josso, Jorge Larrosa e Basarab Nicolescu, sem deixar de mencionar seu interesse recente pelo aprofundamento das idéias desafiadoras de Giorgio Agambem.

Não há dúvida que a idéia-força do pensamento celiano é a construção dos sujeitos educacionais, sobretudo dos ingredientes ligados à formação dos professores. A pedagogia de Célia está materializada no professor como um sujeito consciente e ativo, capaz de se reinventar, de reinventar a escola e o mundo da educação. Seu ponto de partida é a crença de que sem a participação decisiva do professor não haverá a menor possibilidade de transformações qualitativas na educação, sobretudo na educação escolar.

Em função desse enfoque sintetizador, Célia vem avançando na construção de um método de formação de professores baseado no emprego das memórias e narrações compartilhadas, em comunidades escolares as mais diversas, onde os pólos de narrações e memórias criados alavancam processos formativos inovadores, cuja característica fundamental é o estímulo à construção de projetos pedagógicos próprios àquelas comunidades de aprendizagem, o que a autora denomina de projetos instituintes.

4)      Como você vê a influência de sua produção e ação na Educação Brasileira?

Célia Linhares é completa porque harmoniza a palavra e a ação, materializada, esta última, sobretudo em sua produção intelectual e científica, fato cada vez mais raro hoje em dia no campo pedagógico. Em Célia palavra e ação são expressões criadoras, instigantes e provocativas. É impossível ler Célia sem ativar o pensamento.

Se me fosse pedida a lista dos educadores e educadoras mais influentes, produtivos e criadores do Brasil contemporâneo não hesitaria em incluir, numa posição destacada, o nome de Célia. Iniciativas como esta, sob sua responsabilidade, de focar a obra da autora, chegam na hora certa, pois a academia universitária brasileira, em especial a do Rio de Janeiro, precisa resgatar as dívidas que possui em relação à obra de Célia Linhares.

Por outro lado, são cada vez maiores os lançamentos de novos títulos no campo da educação, sobretudo nos grandes mercados editoriais.

No entanto, o que se vê, com raríssimas exceções são certas redundâncias temáticas e variações às vezes pouco ricas sobre questões educacionais que estão em moda e que em muitos casos passam apenas tangencialmente sobre os problemas reais da política educacional brasileira.

Ao lado disso, percebe-se um vazio muito grande de produções realmente inovadoras. A era dos grandes mestres e das obras fundantes parece perdida no tempo e a produção atual não consegue reeditá-la.

É tendo esse contexto de aridez como pano de fundo que situo a importância solar da contribuição intelectual de Célia Linhares, reveladora do alto poder regenerador do pensamento pedagógico brasileiro.

Apesar de todos os méritos que reúne em suas obras, em seus trabalhos e na extensa folha de serviços prestados à educação brasileira, seja nas universidades e na escola públicas, julgo, todavia que a sua influência deveria ser muito maior do que tem sido.

Torço para que trabalhos como este seu possam ajudar mais o Brasil a conhecer a obra celiana.

5)      Você já teve a oportunidade de ler alguma de suas obras? Qual? Comente algum aspecto que chamou sua atenção na obra referida.

A obra intelectual e pedagógica de Célia Linhares chama a atenção, sobretudo por dois aspectos: pelo conteúdo filosófico de elevado padrão cultural e pela beleza literária, que transformam seus textos em verdadeiros poemas pedagógicos, sem esquecer o tanto que é volumosa, denotando tratar-se de uma das mais fecundas educadoras deste país.

Detentora de uma formação acadêmica invejável, construída nas melhores universidades brasileiras, latino-americanas, norte-americanas e européias, com atuação destacada na vida acadêmica nacional e internacional, como docente e pesquisadora renomada, sua produção intelectual é vastíssima, contabilizando quase 60 obras, entre livros, direção de coleções, artigos em revistas nacionais e internacionais, conferências publicadas em anais de congressos nacionais e internacionais, além de ensaios, conferências, palestras e consultorias técnicas em vários estados brasileiros.

Merece destaque em sua trajetória o fato de ter participado da fundação das principais associações científicas da área educacional, como ANPED, ANFOPE e AELAC, bem como sua militância política, doce e firme ao mesmo tempo, em favor da redemocratização do país e em defesa da escola pública autônoma, competente e de qualidade para todos.

Orgulho-me de ter em minha biblioteca pessoal boa parte da obra de Célia Linhares e ter sido ao longo dos anos e continuar sendo um apreciador e divulgador de sua contribuição intelectual e profissional. Sempre que necessito recorro aos seus livros para aprender e meditar sobre questões da educação brasileira. Não posso negar que tenho um carinho especial pelo livro Escola Balaia, escrito por ela e publicado em 1999, onde narra de forma lúcida e poética a sua experiência em Caxias, onde fui dirigente municipal de educação. A escola e os seus Profissionais, publicada em 1997 é outra obra de referência para mim. As obras mais recentes as acompanho de perto.

A ACADEMIA E O SOL DA LIBERDADE

 (Discurso de posse do Psiquiatra Ruy Palhano Silva na Presidência da Academia Maranhense de Medicina, no final de 2006)

 

1.A MEDICINA VEM DE LONGE

A Medicina é conhecimento e ciência para manter e restaurar a saúde humana, entendida hoje como um complexo que envolve o bem estar físico, mental e social. Não é como muitos ainda a traduzem: um engenho para a cura das doenças. Para nós, os médicos, a medicina vai mais além: é um presente divino, recebido das mãos de Hipócrates há 300 anos antes da era cristã, que nos agracia com uma outra vida.

É uma longuíssima história. Vai das explicações sobrenaturais e mágicas do fundador curioso e perseverante, passando por Asclepíades de Bitínia, Galeno, os religiosos medievais e suas extravagâncias, pelos estudos de Pasteur, Lister, Fleming, apenas citando alguns clássicos nessa interminável luta que os seres humanos travam contra a morte; chegando ao momento atual, onde a ciência e a tecnologia médicas assumem dimensões extraordinárias e fantásticas, influenciadas pelos conhecimentos avassaladores que os cientistas possuem sobre o código genético.

A história da medicina no Brasil é muito rica, embora não tenha uma longa tradição temporal. Em nosso país, até o século XIX, os feiticeiros e curandeiros tinham largo trânsito e prestígio. Predominava inteiramente a medicina dos pagés e os amuletos e ervas dos negros africanos. Por muitos anos prevaleceu a chamada medicina caseira: para curar enxaquecas: rodelinhas de limão na fronte; para febres: suadouros de sabugueiro e quina; para asmas: cataplasmas; para sífilis: carne de víbora em pó; para a tuberculose pulmonar: açúcar rosado com leite de jumenta ou cabra; para verminose: raspas de chifre de veado; e para os loucos, o hospício.

Data de 5 de novembro de 1808 o decreto de D. João VI criando a Escola Anatômico-Cirúrgica e Medicina, em Salvador, que inicia oficialmente o ensino da medicina no Brasil, precursora da Faculdade Nacional de Medicina do Rio de Janeiro, por décadas a principal escola médica do país. Daí em diante a história é outra e a medicina nacional avança com vigor e largo prestígio internacional, adquirindo status elevado em algumas áreas, ocupando os primeiros lugares no mundo.

2. AACADEMIA TAMBÉM É MUITO ANTIGA

Aos gregos novamente devemos a criação das academias. Tudo teve início no sítio do herói mítico Akademus, em Atenas, local preferido pelo grande Platão para pregar e proferir palestras aos seus discípulos, explicando o mundo e os seus mistérios. Nasceu como um sol da liberdade, a iluminar um mundo completamente hierarquizado. A importância da Academia de Platão foi tão grande que durou quase mil anos, sendo extinta pelo intransigente imperador Justiniano, no ano 529 d.C.

O exemplo todavia não pode ser apagado e desde então as academias florescem no mundo todo, cumprindo o papel insubstituível de lugares especialmente  escolhidos pela humanidade par cultivar e interpretar o mundo, em suas manifestações culturais, literárias, físicas, artísticas, científicas e sobretudo universitárias. Nos tempos modernos a Académie Francaise, fundada em 1635, por Richelieu, no reinado de Luís XIII, é a demonstração cabal dessa continuidade histórica, composta por 40 imortais, em cujo modelo se espelhou a Academia Brasileira de Letras e centenas de outras no mundo inteiro.

A Academia Nacional de Medicina, por seu turno, é uma instituição centenária em nosso país, apesar de pouco divulgada. Sob o nome de Sociedade de Medicina foi fundada por Souza Meireles em 1829, sendo denominada em seguida de Academia Imperial de Medicina. Os acadêmicos para pertencerem aos seus quadros precisavam apresentar teses científicas. É a matriz de uma rede de academias médicas estaduais, que se espalha por todo o país, que, juntas, constituem um espaço cultural e científico altamente importante para a preservação da memória e para o desenvolvimento da cultura, do conhecimento e da ciência médica neste país.

3. MAS O LABORATÓRIO É AQUI

A missão que hoje recebemos de presidir a Academia Maranhense de Medicina nos coloca inexoravelmente como atores nessa dinâmica institucional. O desafio posto é o da construção do presente, olhando com firmeza o futuro, para poder honrar o contributo de todos aqueles que nos antecederam. Com certeza teremos o mundo e o Brasil como referências para o nosso trabalho, todavia o nosso laboratório é aqui, esta terra sofrida e querida denominada Maranhão.

O longo período da história maranhense já dura muito tempo. Estamos certos de que se trata de uma fase marcada por transições econômico-sociais intermináveis e até exasperantes. Não é por outra razão que neste pedaço do território latino-americano ainda hoje se vive sob a tutela de um mundo mítico, onde a própria modernidade se confunde com a incorporação plena de mitos e lendas do passado. Até mesmo as novíssimas gerações, plasmadas sob os signos da ordem mundial globalizada, ainda se inspiram na atávica fixação telúrica ao “torrão maranhense”, no que reforçam os nossos adiamentos face à história.

Decorrem desta maneira especial de olhar introspectivamente o Maranhão as dificuldades relacionadas a todo e qualquer esforço de interpretação sobre o presente, o passado e o futuro desta terra e de seu povo. Os mitos e a fixação telúrica chegam a ser tão recorrentes que todos aqueles que ousam desafiá-los não escapam ao crivo impiedoso dos seus defensores, sempre dispostos a perpetuá-los a qualquer preço.

O momento histórico vivido pelo estado, e sobretudo pelo país, marcado por uma crise política sem precedentes, não deixa dúvida de que é preciso passar a limpo o que foi, o que é e o que será o Maranhão, e também o Brasil, daqui para a frente. Isto significa, antes de tudo, colocar os mitos de cabeça para baixo, revelar os avessos, confrontar a razão patrimonialista e, sobretudo, ajudar a produzir uma cosmovisão que ocupe o lugar das explicações hegemônicas. Significa também enfrentar os curadores de um espólio intelectual já ultrapassado, mas que ainda continua servindo como panacéia ideológica em favor do conservadorismo anacrônico e do elitismo arrogante. Por ser um fenômeno social alimentado pela própria transição histórica inconclusa, produz um círculo vicioso onde funciona, ao mesmo tempo, como criador e criatura desse mundo ficcional à parte que é o sagrado “torrão maranhense”.

De que maneira a nossa Academia pode colaborar para a reinvenção do Maranhão?

Primeiramente tendo a humildade e a clareza necessárias para reconhecer os nossos limites e o muito que precisamos trabalhar se quisermos de fato instituir uma outra civilizaçãoem nosso Estado.Estamoscom sorte neste particular. Assumimos a Academia Maranhense de Medicina em uma hora excepcional, porque a sociedade está transbordando esperanças. A despeito dos tempos sombrios e das tempestades crescentes que agitam mares e terras, um sol brilha do  nosso lado.

Como a velha academia ateniense, a nossa renasce para cultivar a liberdade em nossos espíritos e em nossos corações. Para isso, a AMM precisa de autonomia e legitimidade social. Nunca foi e jamais será um lugar de privilégios, um sacrário, um templo de eruditos, um ateneu que reverencia iluminados. Seu destino maior é a humanidade livre de grilhões de toda ordem, um lugar da sociedade maranhense onde se constrói o saber criativo e útil à vida, um lugar de inteligência e sabedoria em favor do povo maranhense, que precisa, mais do que nunca, de esperanças e crenças no futuro que acontece agora.

As lições aprendidas com a história recente nos revelam que deixar as coisas ao sabor das regras vigentes poderá resultar no fim da nossa civilização. Nada está pré-estabelecido a ponto de não poder ser mudado. Tudo depende e dependerá de nossas ações e omissões. A banalização do cotidiano nos empurrará forçosamente para a barbárie e para o fim de tudo.

Esta é a nossa missão, a missão de todos, pois, como escreveu o poeta João Cabral, “um galo sozinho não tece uma manhã.”

Estamos convictos de que o nosso desafio não se revelará se nos contentarmos apenas a ocupar os lugares já prontos; o mais importante de tudo é reinventá-los.

Estimulando o desenvolvimento do conhecimento e da ciência médicas no Maranhão, a AMM estará contribuindo para que todos nós sejamos de fato sujeitos ativos na capacidade de idealizar e realizar mundos novos e sonhos exeqüíveis.

Para isso, parodiando a canção popular, não precisamos de pressa desatinada, basta levar o sorriso e a esperança de quem já chorou demais, ou, ainda, lembrando Octavio Paz, ter a certeza de que tudo na vida “está banhado por uma luz antiqüíssima e ao mesmo tempo acabada de nascer”.

MUITO OBRIGADO!

A UNDIME E OS DESAFIOS DA EDUCAÇÃO MUNICIPAL

(Publicada na revista Estudos Avançados, vol.15, nº 42, S.Paulo May/Aug. 2001)

Neroaldo Pontes de Azevedo

(Ex-Presidente da Undime Nacional)

“Não é possível refazer este país, democratizá-lo, humanizá-lo,
torná-lo sério, com adolescentes brincando de matar gente,
ofendendo a vida, destruindo o sonho, e inviabilizando o amor.
Se a educação, sozinha, não transforma a sociedade, sem ela,
tampouco, a sociedade muda.”
Paulo Freire

Situando a questão

CONSTITUIÇÃO FEDERAL, de 1988, e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, de 1996, definiram com clareza o papel e a importância do município como ente federativo autônomo, na formação e na gestão da política educacional, criando, inclusive, o seu próprio sistema de ensino. Também do ponto de vista legal está definida a colaboração entre União, estados e municípios como sendo o regime adequado para a busca de uma educação de qualidade e não-excludente.

As definições legais têm sido instrumentos necessários para a melhoria do desempenho da educação nos municípios, mas elas só acontecem e têm desdobramentos favoráveis em função do empenho da sociedade organizada e do poder público.

É justo constatar que vem crescendo, hoje, no Brasil, a consciência de que a educação é um direito de todos. Um instrumento fundamental para a construção da democracia brasileira, para a afirmação da nossa cidadania. Multiplicam-se os seminários, os encontros, os prêmios, a divulgação de experiências exitosas, as parcerias, o debate em torno da importância da educação.

Municipalização, financiamento, regime de colaboração são questões centrais no panorama da educação municipal, além de outras, não menos importantes, como formação de professores, avaliação de desempenho, autonomia das escolas, gestão democrática, projeto político-pedagógico.

Em defesa de uma educação de qualidade, a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (UNDIME) vem se unindo àqueles que lutam pelo resgate da dignidade da escola pública e atuam em favor da educação. Falar, pois, da undime, que está completando 15 anos em outubro de 2001, é descrever a ação de um dos agentes dessa luta e, ao mesmo tempo, repassar as principais questões que envolvem a educação pública nos municípios brasileiros, nos últimos anos.

UNDIME: um pouco de história

Como entidade nacional reunindo dirigentes municipais de educação das diversas regiões do Brasil, a UNDIME teve seu registro de nascimento em outubro de 1986, quando realizou, no Colégio Militar de Brasília, o seu primeiro fórum nacional.

Mas foi em Pernambuco que a entidade começou a ser gestada, a partir de uma reunião de secretários de educação realizada em agosto de 1985, quase todos pertencentes à região metropolitana do Recife, que “tinham em comum a oposição ao governo estadual e o desejo de realizar uma educação pública transformadora, democrática e de qualidade, apesar das naturais diferenças políticas entre eles” (1).

Fruto dessa articulação, nasceu o 1º Encontro de Dirigentes Metropolitanos de Educação realizado em Recife, em março de 1986, e, posteriormente, o 1º Fórum Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação, marcando assim a passagem do regional para o nacional do movimento pela educação municipal.

Em tese de doutorado (2), Lúcia Maria Wanderley Neves, explorando os vínculos entre educação e política, analisou o processo de criação da UNDIME, que “se inclui entre as manifestações sociais pela ampliação dos espaços democráticos, a partir da instalação da Nova República”. As eleições dão lugar, em Pernambuco, à vitória, na região metropolitana de Recife, a prefeitos oposicionistas, que logo atraem a retaliação por parte do governo do estado.

É, pois, nesse contexto, e em franca contraposição ao Conselho dos Secretários Estaduais de Educação (CONSED) que já havia sido criado em 1982, no Rio de Janeiro, que surge a organização dos secretários municipais de educação. O objetivo explícito do movimento, segundo textos então produzidos pelo Coletivo de Dirigentes Municipais de Educação, era “introduzir a questão da municipalização no debate educacional do país”.

A autora analisa a contradição inerente às convergências de interesse entre a UNDIME e o MEC, embora estivessem em posições ideológicas diferenciadas. Controlado pelo PFL, “o MEC, que defendia a tese da municipalização do ensino, viu no apoio a esse movimento nascente uma oportunidade de se legitimar frente às ‘áreas fortes’ — área econômica, sob o controle do PMDB — da Aliança Democrática”.

Defendendo os interesses maiores da população, o Coletivo de Dirigentes tinha o apoio do MEC, num verdadeiro “emaranhado de interesses contraditórios”, mas lutava pela superação de métodos clientelísticos de administração pública, nos âmbitos federal, estadual e municipal. “Utilizando-se de critérios nem sempre transparentes”, comenta Lúcia, “a entrada do MEC no circuito do I Encontro Metropolitano ampliou-o consideravelmente, dando até caráter de política oficial ao que era antes um movimento de grupo que pretendia, de baixo para cima, provocar a mudança de rumo da educação nacional”.

Do primeiro Fórum Nacional ao segundo, realizado no final de 87, a entidade consolidou-se nacionalmente, com propostas definidas para a educação: defende a municipalização do ensino, a descentralização dos recursos, a definição de competências das três esferas de ensino. São questões daquela época, são questões de sempre, são questões de hoje.

Presente em todos os estados brasileiros, a UNDIME, procurando articular e coordenar os interesses comuns das secretarias municipais de educação, legitimou-se como instância representativa dos municípios brasileiros, desempenhando papel importante nos processos de discussão, formulação e implementação das políticas nacionais de educação.

Perfil do secretário municipal de educação

O crescente papel dos municípios na educação infantil, no ensino fundamental e na educação de jovens e adultos tem exigido um perfil diferenciado dos dirigentes municipais de educação, que inclui formação técnica e, ao mesmo tempo, capacidade de formulação e gestão das políticas públicas educacionais.

Em face desse novo cenário da política educacional no país, ficou evidente a necessidade de adoção de mecanismos para a melhoria da gestão municipal da educação. Um dos passos importantes desse processo consiste em conhecer o perfil das pessoas que estão à frente dos órgãos municipais de educação.

Assim, com base no protocolo de cooperação assinado entre a UNESCO e a UNDIME, decidiu-se pela realização de uma pesquisa ampla sobre os dirigentes municipais de educação (DME). A pesquisa, publicada no livro intitulado Dirigentes municipais de educação: um perfil (3), foi realizada nos anos de 98 e 99, tendo envolvido 1973 dos 5507 secretários municipais (uma amostragem correspondente a 35%), por meio de um questionário enviado pelos Correios, abrangendo aspectos como a formação e a qualificação dos DME, a preparação para o cargo, a remuneração dos DME, a filiação partidária, a gestão municipal nas áreas pedagógica e administrativa.

Os resultados da pesquisa revelaram um perfil bastante frágil dos então secretários municipais de educação. Esse perfil, no contexto das aceleradas mudanças a que vem sendo submetida a educação brasileira no atual momento, torna, segundo Palhano, “mais e mais complexa, e conseqüentemente mais difícil, a atuação dos DME, na medida que constituem, por razões históricas, um quadro profissional de baixa estruturação interna; comandam órgãos públicos que foram tratados com descaso em quase todos os rincões deste país; dispõem, além disso, de pouca autonomia administrativa, financeira e gerencial.”

Hoje a escolha do secretário municipal de educação a partir de critérios técnicos e a sua inserção em processos de formação continuada é uma exigência para que a administração do ensino público municipal atenda às necessidades da população quanto à escola pública, no que diz respeito à eficiência, à competência, à prática da democracia e da cidadania.

Repensando a municipalização

Municipalização é termo complexo, revelando diversas facetas e gerando acaloradas discussões. Caberia, de início, fugir à contenda sobre a qualidade — melhor ou pior — da educação ofertada pelos estados ou pelos municípios. A realidade regional é tão diversificada e tão diversa a situação dos estados e dos municípios, que só uma análise aprofundada e específica, revendo a história e apontando tendências, poderia estabelecer parâmetros de comparação.

Há outro tipo de argumentação que pouco elucida o entendimento do problema: uma contraposição entre os que defendem o ensino no município por acreditar que a administração municipal, mais perto do cidadão, é mais democrática e, portanto, mais eficiente, e aqueles que não aceitam a crescente responsabilização do município, particularmente porque tal perspetiva confunde-se com a orientação neoliberal, presente nos últimos governos, em que a União repassa atribuições para os municípios, isentando-se da sua responsabilidade, tudo em consonância, aliás, com os ditames do FMI e do Banco Mundial. Embora sejam pertinentes os argumentos, analisar a questão só deste ângulo é, no mínimo, uma atitude estática, que não considera as possibilidades de mudança num tal quadro. Há também outros argumentos contrários à municipalização do ensino fundamental, seja porque os municípios são o lugar do “coronelismo”, seja porque esgotaram suas possibilidades de atendimento, ou ainda, porque têm menos recursos do que os estados (4). Cabe registrar, mais uma vez, que se as alegações são verdadeiras, elas deixam de contar com a possibilidade, por exemplo, de uma reforma tributária, que possa ser justa para com os municípios. Há ainda, e fortemente, os que não acreditam na capacidade de os municípios fazerem educação de qualidade, porque seus gestores são irresponsáveis com os recursos públicos. Infelizmente é forçoso reconhecer que recursos da educação têm sido, aqui e ali, desviados de sua finalidade. Ao tempo em que é preciso fugir da generalização, é doloroso reconhecer que as falcatruas não são apanágio dos municípios. Acontecem, também infelizmente, nos estados e na União. Só a defesa clara e objetiva de uma marca ética no trato da coisa pública, traduzida pelo acompanhamento sistemático da sociedade civil e pela punição dos culpados, pode mudar tal quadro.

O fato observado, e digno de acompanhamento, é que vem crescendo o número de alunos no ensino fundamental, sob a responsabilidade dos municípios. Em muitos casos, particularmente depois da criação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF), o determinante tem sido o financiamento, e não o atendimento ao aluno, do ponto de vista da qualidade do ensino ofertado. Mais de 50% das matrículas no ensino fundamental, na rede pública, já se concentram nos municípios: essa é a realidade.

Assim, não pode ser vista como benéfica para a educação a municipalização entendida como simples transferência de alunos da rede estadual para a municipal, sem se levar em consideração também os encargos financeiros e a capacidade do município, em cada caso, de ampliar, com qualidade, os seus serviços educacionais.

Em síntese, a municipalização só poderá ser vista como um benefício para a educação se for proveniente de um processo educado de negociação. É forçoso reconhecer que não tem sido essa a prática, na grande maioria dos estados. Ao lutar por uma adequada reforma tributária, ao defender uma nova visão do pacto federativo, marcada pela colaboração, e ao propugnar por um processo de efetiva descentralização, não só dos recursos, mas das decisões, respeitadas as instâncias autônomas, a UNDIME coloca-se a favor de uma educação de qualidade, no âmbito dos municípios brasileiros e do país como um todo.

É feliz a observação do professor José Marcelino: “O que faz boa uma administração pública não é o fato de ser municipal, estadual ou federal, mas o compromisso político de quem a assume” (5).

Financiamento da educação

É necessário reconhecer que têm acontecido avanços, particularmente no que diz respeito ao ensino fundamental, na busca da universalização e da qualidade. Mas é preciso também reconhecer que os resultados obtidos, recentemente avaliados pelo Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB), por exemplo, ficam ainda longe daquilo que temos obrigação de almejar. Seria reducionismo atribuir todos os limites à questão do financiamento, sabemos que outros males atingem a educação. Mas, sem dúvida, o atual modelo de financiamento do ensino fundamental, derivado da Emenda Constitucional n.º 14, de 27 de setembro de 1996, da Lei n.º 9394 — Diretrizes e Bases da Educação Nacional — de 20 de dezembro de 1996, e da Lei n.º 9424, de 24 de dezembro do mesmo ano, que criou o FUNDEF, passou a definir novos rumos para a educação básica no país.

Responsáveis, legalmente, pelo ensino médio, os estados estão envolvidos em dificuldade, porque vem crescendo o número de matrículas neste nível de ensino, provocado pela melhoria no fluxo de atendimento do ensino fundamental. Por sua vez, a educação infantil vem sofrendo prejuízos extraordinários, em conseqüência do afastamento brusco dos estados desta responsabilidade e da necessidade de muitos municípios criarem ou ampliarem as matrículas no ensino fundamental, premidos pela necessidade de recuperarem os recursos retirados compulsoriamente de seus impostos, por força da criação do FUNDEF.

É necessário lembrar que a lei que criou o FUNDEF afastou-se de dois pressupostos que eram defendidos em 1994, quando da mobilização para o Plano Decenal de Educação para Todos: não garantiu um piso nacional de salários e limitou-se ao ensino fundamental. Além disso, três vetos presidenciais trouxeram prejuízos à educação nos estados e particularmente nos municípios. A não-contabilização do segmento dos jovens e adultos trouxe, até hoje, problemas para essa modalidade de ensino fundamental. A possibilidade de uso, pela União, de recursos do salário educação para a eventual complementação do custo-aluno, diminui o aporte de recursos da União para os Fundos Estaduais. E a não-regimentação da divisão da quota-base do salário educação entre estados e municípios vem gerando, ainda hoje, prejuízos financeiros para os últimos.

Sabe-se que a negociação com os governadores para a aprovação do FUNDEF motivou esse último veto. A UNDIME tem lutado pela derrubada dos vetos, mas a correlação de forças lhe tem sido adversa.

Faz-se necessário, com urgência, um aporte de recursos para a educação infantil. Quanto à educação de jovens e adultos, o recém-lançado programa “Recomeço” pretende corrigir uma lacuna. É cedo para avaliação. Cabe assinalar que a implantação do FUNDEF trouxe um impulso novo para a busca da universalização do ensino fundamental e propiciou, particularmente nos municípios pequenos das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, melhoria salarial para os professores. Em muitos casos o avanço se deu com a elaboração dos Planos de Carreira e Remuneração do Magistério, incentivando de modo especial a qualificação e a titulação dos profissionais do magistério.

O problema mais grave com relação ao FUNDEF é, sem dúvida, a definição do custo-aluno. Definido em 1997 em R$ 300 por ano, hoje encontra-se ainda em patamares que ferem a própria legislação: R$ 363 para a 1ª à 4ª série, e R$ 381,15 para a 5ª à 8ª, quando R$ 540 seria o mínimo, para se cumprir a lei.

Para justificar o desrespeito ao § 1º do art. 6º da Lei 9424/96 — “O valor mínimo anual por aluno, ressalvado o disposto no parágrafo 4º será fixado por ato do Presidente da República e nunca será inferior à razão entre a previsão da receita total para o Fundo e a matrícula total do ensino fundamental no ano anterior, acrescida do total estimado de novas matrículas, observado o disposto no art. 2º, parágrafo 1º, incisos I e II” — o governo federal impõe um entendimento que afronta a própria lei, apresentando uma interpretação intencionalmente equivocada ao tomar como referência índices por estado, e não pelo conjunto do país.

A eficiente propaganda oficial garantiu, por exemplo, que o FUNDEF se fixasse no imaginário popular, e mesmo no âmbito dos que fazem educação, como o grande financiamento do governo federal para o ensino público. Ressalte-se que, para este ano de 2001, a contribuição da União não deverá chegar sequer a 3% do total de recursos envolvidos no FUNDEF, que é da ordem de cerca de R$ 19 bilhões. Com isso, não mais do que sete estados deverão receber complementação do governo federal a título do FUNDEF.

Não deixa de ser preocupante que o FUNDEF tem prazo de vigência; muitos municípios terão sua capacidade de investimento reduzida. É importante corrigir os desvios da atual legislação e discutir um novo perfil para o Fundo. Segmentos do Congresso Nacional e da área de educação vêm propondo a criação de um Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica (FUNDEB), em substituição ao FUNDEF. O FUNDEB, segundo seus proponentes, viabilizaria a democratização da participação dos estados e dos municípios na oferta de todas as etapas da educação básica; a possibilidade da elevação do custo-aluno-médio-anual; e um maior esforço para a arrecadação fiscal e eficiência da gestão.

O inalienável direito do cidadão a uma educação digna exige a imediata revisão do custo-aluno em valores que, no mínimo, respeitem a lei. Essa seria uma das contribuições positivas no processo de aperfeiçoamento do regime de colaboração.

Regime de colaboração

A Constituição Federal, no seu art. 211, define a organização do sistema educacional no país: “A União, os estados, o Distrito Federal e os municípios organizarão em regime de colaboração seus sistemas de ensino.”

A Emenda Constitucional n.º 14, no seu art. 3º definiu, de forma objetiva, o papel de cada sistema de ensino, atribuindo responsabilidades específicas, mas consolidando o regime de colaboração.

“Art. 3º — É dada nova redação aos §§ 1º e 2º do art. 211 da Constituição Federal e nele são inseridos mais dois parágrafos, passando a ter a seguinte redação:

“Art. 211 — ………………………………………………………………………………..

§ 1º — A União organizará o sistema federal de ensino e dos territórios, financiará as instituições de ensino públicas federais e exercerá, em matéria educacional, função redistributiva e supletiva, de forma a garantir equalização de oportunidades educacionais e padrão mínimo de qualidade do ensino, mediante assistência técnica e financeira aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios.

§ 2º — Os municípios atuarão prioritariamente no ensino fundamental e na educação infantil.

§ 3º — Os estados e o Distrito Federal atuarão prioritariamente no ensino fundamental e médio.

§ 4º – Na organização de seus sistemas de ensino, os estados e os municípios definirão formas de colaboração, de modo a assegurar a universalização do ensino obrigatório.

A Emenda consolidou uma prioridade para o ensino fundamental, dando origem ao FUNDEF, tornando mais graves ainda as obrigações do município, no sentido de universalizar o ensino fundamental.

Só uma reforma tributária que descentralizasse recursos, em função das obrigações, poderia tornar menos penoso para os municípios o exercício, com qualidade, das suas obrigações legais. Como se sabe, tal fato não ocorreu, e a União continua centralizando recursos e, por conseqüência, centralizando decisões.

Era de se esperar que uma efetiva colaboração entre União, estados e municípios, garantida na lei, se traduzisse efetivamente em prática.

A União não vem cumprindo o seu papel, no que diz respeito ao ensino fundamental, porque, conforme já assinalamos, desrespeita a própria legislação que criou o FUNDEF. Se o custo-aluno, hoje, estivesse nos patamares exigidos pela legislação, no mínimo 15 estados da Federação estariam recebendo complementação da União, o que significaria, na prática, um elemento de contribuição para diminuir as desigualdades regionais.

A tarefa supletiva da União ocorre principalmente com os recursos do salário-educação, repassados para estados e municípios mediante convênios geridos pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), de forma descontínua, trazendo dificuldades para o planejamento dos estados e dos municípios.

Uma outra forma de colaboração, com caráter redistributivo, é o Fundescola, antigo Projeto Nordeste, que atua nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, com significativa parcela de recursos provenientes do Banco Mundial, que dita normas rígidas para os investimentos. Tal forma de atuar é um dos principais fatores de centralização de poder.

A relação entre estados e municípios ainda não atingiu um patamar de colaboração no nível desejado. Ao longo dos anos, presenciou-se a um crescimento diferenciado e, na maioria dos casos, conflitante entre as duas redes. Os estados ainda se comportam com uma atitude de tutela em relação aos municípios, e o relacionamento fica ao sabor das alianças político-partidárias.

Exemplo típico desta concepção equivocada de colaboração é a distribuição dos recursos do salário-educação. Dois terços desses recursos são repassados para os estados, que têm a obrigação de reparti-los com os municípios, e apenas 11 deles definiram essa forma de distribuição. O fato é que, sendo estados e municípios entes autônomos da federação, não há motivo para se submeter o repasse da quota dos municípios à aprovação da lei nas Assembléias Legislativas. O resultado desse encaminhamento, adotado pela União por pressão dos governadores, é um imenso e desnecessário desgaste para os municípios e, muitas vezes, a retenção daqueles recursos pelos estados, pelo que não sofrem penalidade alguma, ficando esta, para os alunos da rede municipal que também têm assegurado, na Constituição, seu direito à educação. Perdemos a conta de quantas vezes, como UNDIME, encaminhamos ao MEC reivindicação no sentido de que a União repassasse a quota do salário-educação diretamente aos municípios, sem que nenhuma providência tenha sido adotada para resolver a questão, em que pese as reiteradas manifestações de concordância com o nosso pleito. Uma emenda constitucional apresentada pela UNDIME ao MEC, se votada pelo Congresso Nacional, já teria há muito resolvido a difícil situação. Tem, nossa proposta de emenda, o seguinte teor:

“Incluir os parágrafos 8º, 9º e 10 no art. 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, ou seja:

§ 8º — Os 2/3 dos recursos do salário-educação serão divididos, no âmbito de cada unidade da federação, excluindo-se o Distrito Federal, entre os estados e respectivos municípios, levando-se em conta o número de alunos matriculados, conforme apuração do censo nacional de educação realizado pelo MEC.

§ 9º — Na definição do montante a ser distribuído entre estado e municípios, dar-se-á peso 2 (dois) ao aluno matriculado no ensino fundamental e peso 1(um) ao aluno matriculado no ensino médio e na educação infantil.

§ 10º — Pelo período de vigência dos fundos de que trata o parágrafo 2º, os estados e o Distrito Federal, bem como os municípios, conforme o definido no parágrafo 8º, poderão utilizar recursos de sua participação na arrecadação da contribuição social referida no parágrafo 5º do Artigo 212, para promover a expansão e o desenvolvimento do ensino médio e da educação infantil, desde que não haja prejuízos ao atendimento ao ensino fundamental para a população em idade correspondente.”

Por iniciativa da UNDIME, foi possível constituir um grupo de trabalho com o CONSED, e ficou sistematizado um programa de colaboração entre estados e municípios. No âmbito das duas entidades, este entendimento vem prosperando. A dificuldade se dá na efetivação desses propósitos em cada estado. Os procedimentos equivocados em torno da chamada municipalização, de que já falamos, são provenientes desta falta de espírito de colaboração.

Abre-se, assim, mais um espaço propício para a análise e o encaminhamento do regime de colaboração. Promulgado o Plano Nacional de Educação, o momento é de se discutir os Planos Estaduais e os Planos Municipais de Educação. Só uma participação efetiva da sociedade poderá contribuir para que tais procedimentos não consolidem uma disputa, mas uma colaboração.

É preocupante o já acontecido com o PNE. Duas propostas, em disputa no Congresso Nacional, uma proveniente do poder executivo, e outra encaminhada por entidades da sociedade civil, deram lugar a um texto que em muito deve ao que o Brasil hoje precisa para planejar o seu desenvolvimento, tendo a educação como um dos seus pilares. Mais grave, porém, é que nove dispositivos foram vetados pelo presidente da República, responsáveis pela questão do financiamento da educação. Planejar sem prever recursos é transformar o PNE em uma carta de intenções. Abre-se uma verdadeira batalha pela derrubada dos vetos. Difícil, mas possível.

Só uma relação de colaboração, de respeito à autonomia, de divisão de responsabilidades e de consciência do papel da educação pode contribuir para a melhoria do atual quadro de dificuldades da educação do país.

Concluindo

O relatório de Desenvolvimento Humano de 1999, elaborado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), aponta que o Brasil tem uma das piores distribuições de riqueza do mundo, inexistindo políticas sociais públicas e integradas que possam garantir a 60 milhões de crianças e adolescentes o direito à vida, à educação, a um convívio familiar sadio, entre outros direitos.

Para garantir os acordos com o Fundo Monetário Internacional, a maior parte dos recursos do país tem sido utilizada para o pagamento das dívidas interna e externa, deixando em plano inferior a dívida social com os milhões de excluídos, não só do mercado de trabalho, como também do acesso aos direitos mínimos do ser humano.

Dados divulgados pelo UNICEF demonstram que, enquanto os gastos com o social e o investimento com crianças caíram, os recursos para o pagamento da dívida pública dobraram no mesmo período: “Os recursos destinados ao atendimento de crianças e adolescentes não foram poupados dos cortes. No período entre 1995 e 1998, o chamado orçamento criança teve um decréscimo de US$ 2,75 bilhões para US$ 2 bilhões”. Além disso, ainda segundo o UNICEF, os recursos destinados à educação de crianças até seis anos baixaram de US$ 36 para US$ 30,3 milhões, enquanto programas de renda mínima sofreram cortes de 80%”.

Embora limitado, é de se saudar o lançamento, por parte do governo federal, de um programa de renda mínima, do tipo Bolsa-escola. Em fase de implementação, não é possível ainda uma avaliação de seus resultados.

É auspicioso ver que vem crescendo o interesse da sociedade pela educação e que formas de colaboração cidadãs estão sendo postas em prática pelas Igrejas, pelas empresas, ou por organizações não-governamentais. Também há consciência de que tais formas de colaboração não podem substituir o dever do Estado para com a educação. Embora ainda precária, a participação da sociedade no acompanhamento e no controle dos gastos públicos com a educação é, sem dúvida, fator importante que deve ser incentivado.

A tão propalada prioridade da educação ainda não se traduziu, na prática, em ações que apontem uma perspectiva de mudança real, exigida pelos desafios do século XXI.

Num país tão extenso, tão diferenciado, a UNDIME tem um papel a cumprir: fazer com que os municípios participem do debate nacional sobre educação e, mais ainda, busquem cada vez mais, articulando parcerias, realizar uma educação de qualidade.

Notas

1 Raul Jungmann, que veio a ser o primeiro secretário-executivo da UNDIME, registrou o início das articulações, em nota intitulada Elementos para uma história da UNDIME, publicada em junho de 1988, no número de estréia de Educação Municipal, revista criada pela entidade.

2 Ver Lúcia Maria Wanderley Neves. A hora e a vez da escola pública. Rio de Janeiro, UFRJ, 1991. Uma síntese da tese deu lugar à publicação Educação e política no Brasil de hoje, São Paulo, Cortez, 1994.

3 Coordenada por Júlio Jacobo Waiselfisz e analisada por Raimundo Nonato Palhano Silva, a pesquisa foi publicada no ano de 2000, numa edição da UNESCO, UNDIME e Fundação Ford, e encaminhada a todos os prefeitos do país.

4 Ver José Marcelino de Rezende Pinto, Algumas ponderações sobre o debate a respeito da municipalização do ensino fundamental. In: Myriam Krasilchik (org.) USP fala sobre educação. São Paulo, FE-USP, 2000.

5 Id., ibid., p. 78.

Neroaldo Pontes de Azevedo, doutor em Literatura Brasileira pela USP, com a tese publicada Modernismo e regionalismo: os anos 20 em Pernambuco, é atualmente secretário de Educação e Cultura do município de João Pessoa, Paraíba. Foi reitor da Universidade Federal da Paraíba e presidiu a UNDIME, de abril de 1997 a abril de 2001.

UNDIME NO CONTEXTO DA MUNICIPALIZAÇÃO EDUCACIONAL NO MARANHÃO

 

por Raimundo Palhano1

(Modificado em 20.03,2002)

 

1-ORIGENS E PRINCIPAIS REALIZAÇÕES

A UNDIME-MA é uma associação civil, sem fins lucrativos, dotada de autonomia financeira e patrimonial, tendo como sede e foro a cidade de São Luís-MA. Vincula-se à União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação-UNDIME, entidade nacional, com sede e foro em Brasília, que congrega os  Dirigentes Municipais de Educação-DME de todo o Brasil.

O objetivo básico do movimento é articular formulações coletivas de políticas municipais de educação e o desenvolvimento da gestão dos sistemas municipais de ensino. É pois um órgão de representação, articulação e apoio aos interesses da educação municipal, voltado a propiciar formação e suporte instrumental aos DME, na busca de um padrão de educação pública que seja democrática e de qualidade, comprometida com a expansão e o desenvolvimento da cidadania.

A formalização institucional da entidade maranhense ocorreu em 04 de maio de 1987, data da publicação, no Diário Oficial da Prefeitura Municipal de São Luís, do seu primeiro Estatuto, com a denominação de União Maranhense dos Dirigentes Municipais de Educação. Apesar dos mais de quatorze anos de existência, só adquiriu personalidade jurídica em 03 de novembro de 1998, quando o atual Estatuto, datado de 29 de maio daquele ano, foi registrado em Cartório de Títulos e Documentos de São Luís.

Dentre as mais importantes atividades e serviços prestados pela UNDIME-MA, visando atingir os seus objetivos estratégicos, destacam-se:

a)      atividades de formação e capacitação de Dirigentes Municipais de Educação, objetivando contribuir para a melhoria do desempenho dos gestores municipais da educação, tais como cursos, oficinas, treinamentos em serviço, etc.;

b)      realização de eventos de mobilização e atualização coletivas, como campanhas, concursos, seminários, encontros regionais e outros, abarcando os Secretários Municipais e os principais parceiros;

c)      efetivação de reuniões de planejamento, programação e análise, envolvendo a Diretoria Executiva e as Coordenadorias Regionais da UNDIME-MA; interlocutores como a GDH, o Escritório do UNICEF, o Ministério Público Estadual, o Conselho Estadual de Educação, a Federação dos Municípios, entre outros, reforçando a participação da entidade no acompanhamento de planos, programas e projetos educacionais, em âmbito local e estadual;

d)      prestação de assistência técnica, administrativa e informacional às Prefeituras Municipais conveniadas, e demais, através da manutenção de um canal aberto às demandas dos Secretários Municipais de Educação;

e)      manutenção de uma linha editorial, composta pelo boletim UNDIME-MA Informa e pela série Cadernos de Textos, os quais servem para ampliar a prestação de serviços do órgão e divulgar suas principais atividades, circulando entre os 217 Municípios e as principais organizações educacionais do Estado;

f)        desenvolvimento de um padrão organizacional que assegure à instituição uma linha orgânica de atuação, caracterizada pelo fortalecimento da Secretaria Executiva e das Coordenadorias Regionais, como instâncias indispensáveis à geração de competências técnicas necessárias à sua afirmação institucional.

Por tudo isso, a UNDIME-MA vem cumprindo a sua missão social, legitimando-se como órgão de representação da educação municipal maranhense, pelo papel que desempenha nas instâncias de discussão, formulação e implementação das políticas municipais de educação, bem como no seu gerenciamento, seja através de seus órgãos de direção executiva e regional, seja por meio de seus representantes em colegiados vinculados a entidades governamentais e da sociedade civil.

2- O SENTIDO DA TRAJETÓRIA

Um dos maiores desafios da sociedade brasileira neste início de milênio prende-se à necessidade de imprimir qualidade aos seus sistemas públicos de ensino e à educação nacional de um modo geral. Sem uma educação básica includente e de qualidade para todos, o Brasil jamais será um país viável para a maioria de seu povo, permanecendo nos limites de uma sociedade escandalosamente desigual.

Para que isso ocorra, uma das ações inadiáveis vincula-se à importância que todos devemos dar ao desenvolvimento sustentável da educação municipal, hoje responsável quase absoluta pela educação infantil e detentora de um peso cada vez maior no atendimento do ensino fundamental, chegando, em muitos Estados, incluindo-se o Maranhão, a cobrir mais de 70% das matrículas nesse nível de ensino.

É inegável que muitos avanços ocorreram nos últimos anos, graças, sobretudo, a iniciativas da União, dos Estados, dos Municípios e da Sociedade Civil Organizada. A taxa de escolarização do ensino fundamental atinge 96% dos jovens entre 7 e 14 anos, as matrículas no ensino médio crescem expressivamente em âmbito nacional, além de merecerem aplausos ações inovadoras e oportunas na área técnico-pedagógica, como as vinculadas aos novos parâmetros curriculares nacionais, à avaliação do desempenho acadêmico dos alunos, a planos de desenvolvimento da escola, além de outras ligadas ao planejamento educacional, como o aprimoramento do sistema de produção e distribuição de dados e informações estatísticas.

É nesse contexto de inovações que se cria o FUNDEF, em fins de 1996, para implantação compulsória em 1998. Saudado por muitos como uma fórmula quase mágica para alavancar a combalida educação municipal, agora mais abastecida de novos e pesados encargos, o referido mecanismo financeiro vem dando sinais de fragilidade e de reversão de expectativas, sobretudo por uma crescente onda de denuncismo, abrigada, com todas as letras, na grande e pequena mídia, pautada em acusações gravíssimas de má gestão desses recursos pelos administradores municipais, a quem se quer imputar a responsabilidade por um eventual fracasso do programa.

Indo das mais elementares desinteligências administrativas, às mais escandalosas práticas gerenciais, incluindo-se suspeitas de apropriação indébita de recursos públicos, as denúncias colocam em xeque a idoneidade dos gestores do Fundo e motivaram, com justa razão, a instalação de Comissões Parlamentares de Inquérito-CPI’s nos quatro cantos do país, referendadas pela indignação da opinião pública diante dos supostos descalabros administrativos.

Por outro lado, pouca atenção vem sendo dada a problemas como diminuição da oferta de vagas e falta de financiamento para educação infantil; reajuste médio do custo-aluno, no âmbito do FUNDEF, aquém das necessidades reais da educação, e o não-cumprimento da lei no que respeita à diferenciação do custo-aluno; recuo no que se refere à instituição de um regime de colaboração entre Estados e Municípios, em especial quanto à repartição de terços dos recursos do salário-educação entre os municípios; redução crescente dos valores oferecidos pelo FNDE nos PTA’s relativos ao 1/3 do salário-educação, a ponto de em 1999 só duas áreas de projetos terem sido conveniadas; e a necessidade de uma política de financiamento que contemple a educação básica como um todo e não apenas o ensino fundamental, como praticado atualmente. Além disso, é preciso defender e apoiar, intransigentemente, todas as iniciativas da sociedade política e da sociedade civil em defesa das verbas constitucionais da educação, sejam CPI’s e outras de iniciativa do controle social e do controle externo, e, simultaneamente, repudiar todo e qualquer método de gerenciamento dos recursos públicos que traduzam improbidade administrativa e firam a legalidade e os princípios fundamentais da moral e da ética.

A UNDIME-MA tem conclamado as autoridades estaduais e municipais, os integrantes dos poderes legislativo e judiciário, a sociedade civil organizada, os movimentos sociais, as comunidades escolares e a sociedade em geral a se mobilizarem em favor do fortalecimento da educação pública municipal, reivindicando políticas abrangentes de financiamento da educação básica como um todo; cumprimento rigoroso da legislação do FUNDEF, através da revisão dos valores atuais do custo-aluno e suas diferenciações, além da inclusão imediata dos alunos jovens e adultos nos seus cálculos; regularidade nos repasses dos recursos da merenda escolar, do Programa Dinheiro Direto na Escola e demais convênios, sem o que a educação municipal não terá condições objetivas de operacionalizar os seus encargos atuais e muito menos ainda os seus compromissos futuros.

Por outro lado, os desafios de construir uma educação pública de qualidade para todos neste país e neste Estado vão muito além da superação dos atuais problemas com a gestão do FUNDEF. Atribuir ao Fundo poderes messiânicos e punir de maneira arbitrária gestores municipais da educação, em sua maioria despojados de recursos técnicos e administrativos, por força de limitações estruturais do setor, longe de representar um bem para a sociedade, pode levar ao cometimento de profundas injustiças e à culpabilização da própria vítima, deixando ilesos outros segmentos do poder público e da sociedade que também são formalmente co-responsáveis pelo seu monitoramento e controle.

É nesse contexto que a UNDIME-MA define o seu compromisso social e passa a ser uma força a serviço da mudança. Toma partido na luta pelo respeito à autonomia da educação municipal e pela adoção de uma gestão democrática em todos os níveis da política pública educacional. Aspira por um sistema de ensino público capaz de mudar realmente o cenário social e cultural do Maranhão. Por tais razões, o seu foco maior é o Dirigente Municipal de Educação. Transformá-lo em um agente social efetivo a serviço da mudança é a sua aspiração mais elevada. Para isso se propõe a trabalhar pela elevação do padrão técnico e político do DME, tornando-o apto a exercer o seu papel de líder consciente e competente para o exercício autônomo  de seus encargos funcionais e sociais, voltados prioritariamente para a construção de uma educação pública de qualidade para todos.

3- PRINCIPAIS DESAFIOS

Segundo publicação recente2, editada pela UNDIME Nacional, em parceria com a UNESCO e Fundação Ford, são estes os principais desafios a serem enfrentados pelo movimento dos Dirigentes Municipais de Educação:

a)Reduzir os desequilíbrios entre iniciativas de formação técnica e de formação política. Os números deixaram bem nítido que os DME não priorizam engajamentos em movimentos ou campanhas de cunho político-institucional. É correta a estratégia da UNDIME de não ser confundida como uma central sindical, sem o que já teria deixado de existir. No entanto, sua condição de órgão de representação de interesses coletivos, exige uma arena e uma agenda política para expandir-se;

b)Aprimorar o campo de atuação profissional do DME. É uma tarefa das mais urgentes, embora de complexa implementação. A direção dos sistemas municipais de ensino não pode ficar entregue a quadros despreparados técnica e pedagogicamente. Urge que se dê um sentido orgânico aos papéis desempenhados pelos Dirigentes Municipais de Educação enquanto condutores da política pública educacional, neutralizando assim a forte inorganicidade ainda hoje presente no cotidiano da  grande maioria deles;

c)Adotar a gestão participativa como componente intrínseca do processo de produção e implementação das políticas educacionais em âmbito municipal. O modelo tradicional de gestão educacional tem se revelado ineficiente, caro e inadequado, a ponto de colocar os indicadores educacionais do país em níveis muito baixos em relação ao contexto internacional. O novo processo pode se iniciar pela adoção generalizada de critérios técnicos, pedagógicos e participativos para a escolha de dirigentes escolares, com o que se eliminaria o predomínio do clientelismo e se asseguraria a escolha de profissionais qualificados para a direção das escolas;

d)Organizar os DME para contribuírem na construção de uma nova municipalização educacional que tenha como ponto de partida a autonomia dos sistemas municipais de ensino. Começando pela defesa da descentralização do poder decisório em todas as iniciativas de municipalização educacional, cujo sentido e  direção devem priorizar o espaço escolar-pedagógico e não o complexo político-administrativo, como normalmente ocorre. Sem autonomia municipal intrínseca não se completa o ciclo necessário à existência efetiva de sistemas municipais de ensino e, sem isso, não se rompe a cadeia que mantém a educação básica municipal em estágio  inferior de desenvolvimento e em condições permanentes de subordinação política. A nova municipalização da educação exige pois a socialização do poder decisório e da gestão em todos os níveis, de tal forma que as políticas públicas educacionais sejam ditadas pela maioria, ou por consensos sociais legítimos, extraídos dos diversos setores que compõem o poder local;

e)Ter sempre em conta que o problema educacional é uma questão nacional, mesmo que o seu lugar de existência seja o município. Os problemas que desafiam os DME só serão equacionados e superados se forem assumidos e enfrentados pelos sistemas de ensino existentes no país. Sem regime de colaboração entre eles, visando integrar políticas públicas e acabar com as costumeiras ausências de articulação, os obstáculos não serão removidos. A forma atual de concepção estrutural e organizacional do ensino público deixa patente a necessidade de administração conjunta da educação básica. Sem um regime de colaboração em que esse compromisso seja efetivado não se garante o desenvolvimento dos sistemas de ensino tal como estão formalmente pensados;

f)Propugnar pelo aperfeiçoamento do atual modelo de financiamento da educação fundamental e pela implantação de um novo que abranja a educação básica em sua totalidade. Apesar do reconhecimento da importância do FUNDEF, o atual modelo não supre as necessidades gerais do financiamento da educação básica. A começar pelo reforço aos mecanismos de fiscalização necessários ao cumprimento rigoroso do dispositivo constitucional de aplicação exclusiva dos 25% das receitas de impostos e transferências em manutenção e desenvolvimento do ensino. Além disso, é preciso maximizar as disponibilidades existentes, destacando-se a incorporação do salário-educação e dos recursos de convênios ao orçamento da área, descentralizar sua gestão, inclusive adotando a gestão participativa do orçamento e das finanças, priorizando os gastos em atividades-fim. Algo precisa ser feito urgentemente em favor de mais disponibilidades de recursos para a educação infantil e para o ensino médio, além das correções no atual modelo, o que implica dizer da conveniência e necessidade de um novo padrão de financiamento para a educação básica como um todo.

     3.1-  O Enfrentamento dos Desafios

A UNIDIME-MA cresceu não só quantitativamente, mas, o que é mais importante, qualitativamente. Hoje é uma instituição reconhecida não só pelos Dirigentes Municipais de Educação e pela sociedade, mas, igualmente pelas instituições parceiras, onde se destacam: o Ministério Público Estadual, o Unicef, o Conselho Estadual de Educação do Maranhão, a FUNAC, a FAMEM, o Instituto do Homem e outras organizações governamentais e não-governamentais.

Uma UNDIME-MA cada vez mais forte e necessária depende de duas coisas: primeiramente da participação efetiva dos Dirigentes Municipais de Educação, do seu envolvimento e de seu compromisso com os princípios e com a programação da Entidade e também com as suas finalidades estatutárias;  depois, de sua vontade de colaborar para a sustentabilidade financeira e material do Órgão.

Ainda é muito baixo o número de Convênios assinados pelas Prefeituras com a UNDIME-MA. Urge que os Dirigentes Municipais de Educação estimulem seus Prefeitos a colaborarem, pois estarão fazendo um investimento altamente produtivo. São 217 Municípios no Maranhão e cerca de 5.600 no Brasil. Como seríamos mais fortes se todos firmassem Convênios com a UNDIME, e como poderíamos ser muito mais eficientes do que somos hoje, se tivéssemos mais recursos para implementar novos projetos e novas idéias!!

Mais do que nunca se torna inadiável a consolidação da UNDIME-MA, seguindo uma tendência nacional, como instância efetiva de articulação dos interesses da educação municipal. Em uma conjuntura marcada por grandes exigências técnicas, pedagógicas e administrativas postas aos municípios, em seu papel crescente de gestores da política educacional, a existência de uma UNDIME-MA forte, técnica e politicamente, representará um apoio indispensável ao sucesso das políticas de municipalização da educação preconizadas pela Constituição Federal, pela LDB e presentes nos programas do MEC.

Uma das formas de afirmação institucional da Entidade, no seu papel de articuladora das políticas municipais de educação, decorrerá de sua capacidade de gerar, produzir e disseminar dados e informações que auxiliem o Dirigente Municipal a tomar decisões e elaborar projetos de desenvolvimento. Nesse sentido, a manutenção e desenvolvimento do banco de dados sobre educação municipal assumem peso decisivo pois vem propiciando criação de mecanismos efetivos de atualização e intercâmbio de informações entre as Secretarias Municipais de Educação e subsidiando a elaboração de estudos, programas e projetos a cargo das redes municipais de ensino. No estágio atual da sociedade, nenhuma instituição, seja pública ou privada, governamental ou social, evoluirá, ou mesmo, se manterá funcionando, se não dispuser de um eficaz sistema de informações. A existência de informações técnicas representa uma ferramenta básica para remover obstáculos a uma administração realmente eficiente, justamente aquela que busca atingir níveis crescentes de recionalidade, com máximo grau de qualidade social.

4- POLÍTICA DE ALIANÇAS

Em decorrência desse seu papel de articulação e coordenação das ações educacionais no âmbito municipal, a UNDIME Nacional e suas filiadas têm sido interlocutoras junto ao MEC, aos governos estaduais e municipais,  a Agências Regionais, a instituições internacionais, como  a UNESCO, o UNICEF, a Fundação Ford, entre outras, além de diferenciadas instituições públicas e organizações não-governamentais e da sociedade civil.

No caso específico da UNDIME-MA, a sua malha de interlocução compreende o Escritório do UNICEF, as Gerências de Desenvolvimento Humano-GDH e Desenvolvimento Social-GDS, a Fundação de Apoio à Criança e ao Adolescente-FUNAC, o Ministério Público Estadual, o Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária- CENPEC, a Federação dos Municípios-FAMEM, o Conselho Estadual de Educação, entre outros, além de órgãos não-governamentais e da sociedade civil, como o Instituto do Homem, o Sindicato dos Professores do Maranhão, entre outros.

Um parceria das mais importantes para a UNDIME-MA é a que vem sedo feita com o Ministério Público Estadual, através  do Centro de Apoio Operacional da Infância e da Juventude, a qual gira em torno da implementação do Programa institucional “Educação: Direito da Criança, Dever de Todos Nós”.

O Programa vem realizando várias iniciativas  marcantes, as quais têm repercutido intensamente em todo o Estado do Maranhão, principalmente pelo seu ineditismo e pelo seu conteúdo inovador, destacando-se os Encontros Regionais de Educação e o programa das Teleconferências. Contando, ainda, com a participação qualificada do Unicef, responsável pelo financiamento, e o apoio de órgãos como a FAMEM, o Conselho Estadual de Educação, a FUNAC, o Sindicato dos Professores, as Gerências Regionais, entre outros, o Programa do MPE visa atingir todas as dezoito regiões administrativas do Estado. Os encontros regionais têm o objetivo de materializar consensos sobre questões como implantação de Sistemas Municipais de Ensino, Conselhos Municipais de Educação, Fichas de  Controle da Evasão Escolar, Conselhos Tutelares e dos Direitos da Criança e do Adolescente, entre outros. As Teleconferências, por seu turno, cobrem todo o Maranhão e podem ser acompanhadas de qualquer parte do Brasil e mesmo do exterior.

4.1- A Parceria com a ANPAE-MA

A tarefa histórica voltada à construção de um poder educacional local democrático e autônomo no Maranhão estimula uma efetiva aliança institucional entre a UNDIME-MA e a recém instalada Seção Estadual da Associação Nacional de Política e Administração da Educação-ANPAE, uma das mais antigas e conceituadas associações científicas de administradores educacionais do Brasil e mesmo da América Latina.

A responsabilidade social da UNDIME-MA com a reinvenção da política pública educacional nos municípios maranhenses exige da entidade vínculos permanentes e sólidos com o meio acadêmico e com organizações promotoras do desenvolvimento científico e tecnológico da educação.

Para que a UNDIME-MA se afirme como portadora de mudanças é mais do que evidente a necessidade de que se ultrapasse a luta meramente corporativa e que se transforme numa instância capaz de formular e implementar projetos de direção no campo das políticas públicas, passando a ser também uma instância produtora de cultura na esfera das políticas públicas educacionais, tendo como referência a construção e desenvolvimento sustentado do poder local democrático.

Estando ambas localizadas na esfera da sociedade civil e fortemente identificadas e comprometidas com o desenvolvimento da educação pública de qualidade social, encontrarão grandes facilidades em estabelecerem pactos de ação e interlocução pois estarão isentas de muitas amarras que dificultam e burocratizam as articulações interinstitucionais, principalmente quando estabelecidas com entidades do setor governamental.

Gozando ambas de mais flexibilidade para agir e formular ações conjuntas em prol do desenvolvimento da política, da gestão e da administração da educação, poderão enriquecer e fortalecer a luta mais ampla da sociedade maranhense por um sistema educacional público que não seja excludente e de segunda categoria pelo fato de atender apenas às demandas das camadas mais pobres da sociedade.

Além do mais, a aliança fortalece um dos eixos estratégicos da Seção Estadual da ANPAE, que é aquele voltado à priorização da educação básica municipal como uma das linhas mestras da programação da associação para o próximo biênio, considerando que os municípios maranhenses são responsáveis diretos pelo atendimento de 80% das vagas nesse nível de ensino.

5-O REGIME DE COLABORAÇÃO

Diante da crescente complexidade dos problemas educacionais, não há como conseguir uma verdadeira melhoria de qualidade se não houver, de fato, um regime de colaboração entre a União, o Estado e os Municípios. Enquanto o diálogo entre estas três esferas da política governamental de educação não for verdadeiramente fecundo e produtivo, pouco conseguiremos na direção de um sistema de ensino voltado ao desenvolvimento da sociedade.

O regime de colaboração entre os sistemas está consagrado nas normas constitucionais sobre universalização do ensino fundamental e sobre a garantia da educação básica para os brasileiros. No §4o da Emenda Constitucional 14 está consignado: “Na organização dos sistemas de ensino, os Estados e os Municípios definirão formas de colaboração, de modo a assegurar universalização do ensino ibrigatório”.

Tanto a Constituição, a Emenda 14 e, principalmente, a LDB em vigor, contemplam um vasto número de novos dispositivos educacionais que enfatizam o estabelecimento de regimes de colaboração intersistemas, sem o que não será possível atingir-se os resultados colimados.

Pode-se, com efeito, mencionar, a título de exemplo: a implementação e operacionalização do FUNDEF; as definições sobre sistemáticas de aplicação dos recursos vinculados à Educação e sobre a redistribuição da quota do salário-educação; a institucionalização dos sistemas municipais de ensino e a consequente implantação, nos de maior porte, de conselhos municipais de educação; a política de gestão das redes de ensino em suas várias modalidades e níveis- educação infantil, ensino fundamental, ensino médio, educação de jovens e adultos, etc., e outros mais urgentes, como planos de carreira e remuneração; de capacitação profissional para o magistério; diretrizes curriculares para as áreas urbanas e rurais frente aos novos parâmetros curriculares nacionais, entre tantos outros que estão em evidência ou que entrarão em breve.

Os problemas da educação básica brasileira, por seu turno, impõem que não se fique mais pregando o que não se pratica, numa flagrante estratégia de empurrar para frente uma bomba repleta de efeitos nocivos ao desenvolvimento da educação pública. Não são poucos os estudos e pesquisas que comprovam a forte correlação entre fracasso escolar e falta de efetividade no regime de colaboração entre os sistemas.

Investir no regime de colaboração significa adotar o diálogo, a negociação, com vistas à construção de consensos sobre as responsabilidades de cada um dos sistemas na promoção da educação pública, tendo como base a articulação dos interesses subjacentes em torno da repartição dos fundos financeiros do setor público, dentre eles o salário-educação e o FUNDEF.

Significa a busca de uma engenharia política que crie um verdadeiro sistema de vasos comunicantes, capaz de produzir equidade na divisão dos recursos e complementaridade entre as partes na elaboração de um projeto pedagógico que dinamize o papel da educação pública e assegure a sua qualidade e efetividade social.

O Maranhão não mudará o perfil dos seus indicadores educacionais se não aprofundar, ao extremo, a ligação orgânica entre o sistema estadual e as ainda precárias e incipientes redes municipais de ensino, onde muitas ainda se movem com baixíssimos índices de capacitação técnica e recebem interferências diretas de outros interesses que não os exclusivos da área educacional.

Uma das primeiras gestões da UNDIME-MA em favor da efetivação de um canal para viabilizar ações de colaboração entre o Sistema Estadual de Ensino e os Municípios maranhenses, refere-se à criação de um Comitê do Regime de Colaboração.  Desde a realização do PRASEM II, no primeiro semestre de 1999, onde foi elaborada uma substanciosa  pauta de reivindicações pelos Dirigentes  Municipais presentes, vem a UNDIME-MA tentando viabilizar, junto aos gestores da educação estadual, a institucionalização do referido Comitê. Não resta dúvida que este seria um marco histórico em nosso Estado, pois a aspiração por uma instância como esta é antiga entre os Secretários Municipais maranhenses. Além da UNDIME-MA e da GDH, a proposta é que integrem o Comitê, o Conselho Estadual de Educação, a FAMEM e o UNICEF, sem dúvida nenhuma, instituições estratégicas para a formulação e acompanhamento das políticas públicas no campo educacional.

O PRASEM III trouxe novamente à pauta a necessidade de mais avanços em termos da colaboração Estado-Municípios. Continuamos, no entanto, sem grandes motivos para comemorar, mesmo que se reconheça a predisposição dos dirigentes e a existência de apreços pessoais entre os titulares das pastas envolvidas.

Um fato novo recoloca a questão mais forte ainda: trata-se do cumprimento, pelos Municípios, da exigência legal e já configurada em vários termos de ajustamento de conduta assinados com o Ministério Público Estadual, segundo os quais eles terão até janeiro de 2002 que elaborarem seus Planos Decenais de Educação. Para que essa exigência seja cumprida fielmente, materializada em Planos Municipais de Educação verdadeiramente consistentes, os Municípios precisam, no mínimo, conhecer as diretrizes do sistema estadual para os próximos dez anos, sem o que os Municípios não terão meios de cumprir os acordos firmados com o Ministério Público.

Mesmo numa conjuntura  complexa como a atual, convém que se leve a cabo um bom regime de colaboração. As lideranças educacionais do Maranhão precisam convocar à ação os órgãos públicos, as instituições da sociedade civil e as organizações empresariais com responsabilidade social para um grande movimento pela educação maranhense, tendo a elaboração do Plano Estadual de Educação como fator de aglutinação. Partindo-se dos Municípios, passando-se pelas Regiões e chegando-se ao nível estadual, teríamos condições de formular e implantar um Plano Educacional da mais absoluta importância para a sociedade maranhense.

6-O TRABALHO EM REDE

Com toda certeza, é de grande importância a mobilização social organizada em favor do fortalecimento do processo de municipalização da educação básica no Maranhão, um dos Estados onde a municipalização do setor mais cresceu e cresce. Basta ver que quase 100% das matrículas da educação infantil são municipalizadas; do ensino fundamental aproxima-se de 70%; e, mesmo no ensino médio, cuja responsabilidade de atendimento é sobretudo estadual, os municípios mais de 20% da demanda.

A educação das crianças, jovens e adultos das zonas rurais é feita quase que inteiramente pelas escolas municipais. Este nível expressivo de municipalização da educação básica maranhense deixa claro que o foco das atenções, visando a superação das deficiências e, principalmente, o resgate dos direitos que estão sendo negados a crianças e jovens excluídos do processo educacional formal, deve ser dirigido às redes municipais de ensino e ao fortalecimento e autonomia dos seus sistemas.

A forma de atuar da UNDIME-MA, a partir dos apoios técnicos e financeiros recebidos do UNICEF, tem sido sob a forma de uma rede interinstitucional de apoio às políticas de municipalização educacional. Rede esta que articula contrapartes e parceiros do UNICEF, representativos de OG’s e ONG’s, no sentido de contribuir para a universalização e qualidade da educação pública municipal e a construção de sua autonomia, visando garantir o acesso ao ensino fundamental de qualidade às crianças e adolescentes excluídos, bem como garantir que as escolas formulem e implementem, com participação da comunidade, projetos pedagógicos de educação integral, apropriados às características de seu contexto sócio-econômico e cultural. Objetiva apoiar a institucionalização de sistemas municipais de ensino; capacitar dirigentes e profissionais da educação; fortalecer as escolas e os órgãos da educação como entes autônomos; implantar projetos político-pedagógicos instituintes; incrementar a elaboração de Planos Municipais de Educação; implantar, apoiar e articular Conselhos Municipais de Educação, de acompanhamento e controle social, tutelares e de direitos; apoiar políticas de formação e valorização do magistério, fortalecer o regime de colaboração entre Municípios-Estado-União e as parcerias com o terceiro setor e com setores produtivos dotados de   responsabilidade social.

Os principais resultados esperados, a partir dessa forma de atuar associada são: maior número de sistemas municipais de ensino implantados e mais aparelhados para o cumprimento de suas finalidades em termos de organização e gestão da rede escolar e dos órgãos da educação; aumento da taxa de acesso e permanência dos alunos na escola; introdução de novos métodos e novas pedagogias, projetos educacionais instituintes e currículos adequados à realidade e necessidades locais; Conselhos Municipais de Educação melhor preparados e demais conselhos de representação social capacitados e aptos a exercerem suas autonomias; Planos Municipais de Educação e Projetos Político-Pedagógicos concebidos e centrados nas expectativas públicas e da comunidade escolar.

Os grupos-alvo principais são Prefeitos, Secretários Municipais de Educação, Dirigentes Escolares, Comunidades Escolares, Conselheiros Municipais de Educação, de Direitos da Criança e do Adolescente, de Acompanhamento e Controle Social, Vereadores, Juízes de Direito, Promotores de Justiça e Lideranças Comunitárias. O principal beneficiário da implementação da rede é a população estudantil matriculada nas escolas públicas municipais. A rede está apta a atuar nas 18 Regiões Administrativas do Estado, envolvendo a participação dos municípios que as integram.

7- AUTONOMIA, QUALIDADE SOCIAL  E PARTICIPAÇÃO COMUNITÁRIA

Sem dúvida, educação de qualidade e clientelismo são incompatíveis. Administrar a educação sob critérios atrasados, como o empreguismo, compromete visceralmente qualquer expectativa de eficiência e qualidade pedagógica.

Uma das pré-condições para o sucesso de qualquer política educacional é a existência de recursos humanos qualificados e capacitados para o pleno exercício de suas funções técnicas e educativas. Se os sistemas de recrutamento e seleção desses recursos não se pautarem nessas premissas e estiverem subordinados a critérios “empreguistas”, a política educacional estará condenada ao fracasso.

Sabemos muito bem que em nosso Estado e em outros de nosso país, a instituição do “cabide de emprego” ainda é muito forte e caracteriza muitas administrações públicas. A longa permanência desse fenômeno em nossa sociedade, principalmente nos municípios do interior, acarreta prejuízos inestimáveis ao nosso desenvolvimento social e cultural e mesmo do Brasil, pois é um fator de negação da cidadania e de concentração de poderes e privilégios nas mãos de poucos.

Devemos, mais do que nunca, permanecer atentos e vigilantes no sentido de que possamos derrotar, para sempre, essas formas tão nefastas de administrar a coisa pública no Brasil. Temos hoje uma Lei de Responsabilidade Fiscal, os Tribunais de Contas mais atuantes e um melhor controle social sobre as administrações públicas.

Até que ponto a autonomia municipal conduzirá a uma ação prática em relação ao compromisso de gestão pública?

A conquista de uma gestão democrática e do planejamento participativo da educação em solo maranhense, ou mesmo em qualquer parte do mundo, não pode ser vista como mera “opção”.

O emergir de uma sociedade democrática deve ser encarado como uma meta superior da sociabilidade humana.

Nossa trajetória nesse mundo, por milhares de anos, tem sido a afirmação de uma sociedade totalitária, onde a grande maioria dos seres humanos nunca teve acesso pleno aos bens produzidos coletivamente. Nossa marca tem sido a escravidão, o servilismo, a opressão e exclusões de toda sorte. Até mesmo neste nosso maravilhoso mundo novo, que, por mais civilizado assim o julguemos, ainda estamos longe de atingir uma sociabilidade mais justa e igualitária.

Chegar a uma sociedade democrática, a um planejamento participativo das políticas públicas, para nós brasileiros, campeões mundiais da desigualdade, jamais pode ser entendido com retórica demagógica, dentre os milhares que temos por aí: atingir uma sociedade democrática e o planejamento participativo da administração pública deve ser visto como uma espécie de imperativo para nossa realização como povo e como civilização.

Como poderemos gerir a política educacional de uma forma eficiente e democrática, se continuarmos renunciando ao nosso direito à autonomia, conquistado desde 1988, pela Carta Magna e reafirmado em 1996, pela nova LDB?

Será que somos realmente incompetentes e incapazes para assumir nossa autodeterminação?

Vamos continuar eternamente tutelados pelas políticas emanadas da União e do Estado?

A conquista da autonomia jamais ocorrerá por qualquer fórmula dadivosa. Se quisermos ser autônomos, cabe a nós conquistarmos esse direito. Ninguém, em nenhuma parte do Brasil e do mundo, sabe mais do que nós o que precisamos fazer para superar nossos obstáculos e definir nossos projetos. Se abdicarmos dessa condição, outros se sentirão encorajados a assumir o nosso lugar e tudo farão para não perdê-lo mais. Este é um fenômeno político inerente ao nosso modelo de organização da vida social.

Gostaria de enfatizar o seguinte: se parece utópico o planejamento e a gestão pública participativos, se estão distantes da realidade política de nosso Estado, se o que prevalece ou prevaleceu mesmo foi a centralização e a política do favor e do clientelismo, não devemos desanimar.

Se nós acreditarmos que é possível chegar a uma sociedade mais democrática e mais justa, mesmo que jamais a vejamos, ela algum dia nascerá. Se estivermos engajados pra valer nesse bom combate, quem sabe se dela não iremos desfrutar? Um sistema municipal de educação autônomo terá muito mais possibilidade de decidir sobre o que quer e sobre qual a política educacional que mais lhe convém, do que um outro, sem autonomia, que apenas segue as políticas que outros sistemas definem, muitas delas inclusive elaboradas sem a sua participação.

Outras duas questões importantes a serem respondidas pela UNDIME-MA. Qual a importância da participação da comunidade na dinâmica das políticas educativas? Que tipos de obstáculos persistem na elaboração e execução de planos e de políticas educativas para os municípios?

A participação da comunidade, não só nas políticas educativas, mas na política pública como um todo é decisiva e mesmo insubstituível. Lamentavelmente, neste Estado e em nosso país, ainda não atingimos esse padrão de governabilidade, onde a participação comunitária e popular efetivamente influi na definição e na gestão das políticas públicas. Nossa marca histórica é a centralização do poder decisório e a subordinação da política pública aos interesses privados e da infra-estrutura econômica nacional e estrangeira.

Victor Vincent Valla3 e tantos outros estudiosos do Brasil afirmam que a extrema concentração de riqueza que temos hoje no país e a vergonhosa desigualdade social a que estamos sujeitos se devem a esse tipo de gerenciamento da verba pública.

Pelo fato dos interesses comunitários e populares nunca terem sido predominantes, os gestores públicos brasileiros e suas elites privilegiaram a montagem de uma poderosa base econômica, em detrimento das condições de vida e de reprodução da classe trabalhadora.

No caso da política educacional, tomando apenas o exemplo atual, o que se observa é o revigoramento de um modelo de descentralização que transforma os municípios em simples apoiadores das políticas educacionais originadas do alto.

Em nome do regime de colaboração ou em razão do exercício de suas funções suplementares, as políticas educacionais produzidas pelos Estados e pela União estão invadindo de tal maneira o espaço decisório local que os municípios estão se transformando em meros executores dessas políticas. Pior de tudo é que, em sua larga maioria, pela flagrante desestruturação de seus sistemas educacionais, aceitam passiva e pacificamente essa nova forma de controle do poder local, que, por isso mesmo, permanece atrofiado e impedido de reagir em favor da preservação ou da conquista de sua autonomia.

Pela nova LDB e mesmo na conformidade constitucional, a comunidade detém uma parcela significativa de responsabilidade na política educacional. Embora tendo como lugar de referência a escola, a educação é um fenômeno comunitário e social, na medida em que nos educamos para viver em comunidades humanas.

Uma educação escolar que não estabeleça um diálogo fecundo com a comunidade está condenada ao insucesso. A escola se oxigena na medida em que se abre para a comunidade e com ela é capaz de estabelecer laços efetivos e afetivos de convivência. Se a escola erguer muros muito altos e se isolar de seu meio corre o sério risco de ficar para sempre confinada à solidão e ao esquecimento.

Os currículos escolares são os meios mais diretos para estabelecer esse intercâmbio, essa ponte entre o mundo da escola e o mundo que a cerca. O que a escola aprende e ensina sempre será mediado pela comunidade e suas especificidades históricas e culturais. Se esta mediação não ocorre, a escola permanece isolada de seu contexto e desvirtuada de suas funções essenciais.

Tem sido muito difícil construir esta ponte em nossa realidade em função de ainda termos uma escola cheia de problemas e inconclusa, o que a torna limitada na tarefa de dialogar positivamente com o seu meio ambiente, isto em decorrência de fatores internos e externos. Precisamos trabalhar muito para superar essa deficiência. Começando pela desmistificação dos problemas que impedem esse diálogo. Não aceitar, em hipótese alguma, a idéia de que a população, por ser, em sua maioria, pobre e iletrada, não tem o que contribuir para o desenvolvimento da política educacional. Às vezes, a limitação não está na comunidade, mas na própria comunidade escolar, no professor, no diretor ou no dirigente municipal ou estadual que não sabe dialogar com o povo. No estágio atual da civilização, a escola que não estiver aberta para o diálogo com os seus vizinhos e com os vizinhos do outro lado do mundo será uma instituição natimorta.

Por quê é tão difícil os municípios formularem e executarem seus planos educacionais? Que obstáculos são esses que poucos conseguem removê-los?

Uma das explicações está no próprio modelo de municipalização que se vem configurando no Brasil. De um lado, conforme a lei maior, os municípios são entes federados autônomos, portanto gozam de prerrogativas iguais às da União e dos Estados; de outro, a União e os Estados pouco fazem no sentido de respeitarem essa prerrogativa, pois cada vez mais interferem na vida municipal. Para que esse obstáculo seja superado é preciso rever o pacto federativo e mudar radicalmente o modelo de planejamento e gestão da administração e das políticas públicas como um todo, de modo que essas contradições e os paradoxos que hoje existem sejam definitivamente escoimados.

Um dos obstáculos internos aos municípios diz respeito a limitações de ordem técnica, administrativa e política, ainda comuns em muitos deles. Dos quase 5.600 municípios existentes no Brasil, é expressivo o número dos que se encontram desaparelhados para assumirem plenamente suas políticas públicas e educacionais em especial. Além da baixa viabilidade econômica, sofrem as conseqüências da escassez de recursos humanos capacitados e qualificados para conduzirem projetos educacionais instituintes, no que se inserem numa espécie de círculo vicioso da insustentabilidade, quando as lideranças políticas e as forças que dominam a administração pública são originárias de grupos atrasados e representativos de oligarquias tradicionais, herdeiras da tradição brasileira que há séculos privatiza a coisa pública.

Um outro obstáculo poderoso está afeto à ideologia da dependência, fomentada pela não superação de uma certa mentalidade de sujeição ao colonizador, ainda forte em boa parte do Brasil, principalmente nas áreas menos urbanizadas.

Nos lugares onde a ideologia da dependência prospera com facilidade, as pessoas em geral renunciam à cidadania e ao civismo e passam a achar que são incapazes de construir uma sociedade sustentável. Aí elencam dúzias de obstáculos, cada qual mais difícil de transpor, e assim se omitem e acabam contribuindo para neutralizar ou mesmo dissolver, qualquer espécie de movimento em favor da autonomia das políticas educacionais nos municípios. Claro que não podemos deixar de reconhecer o despojamento de muitos municípios e suas conseqüentes limitações.

Todavia, se cruzarmos os braços, nós os filhos da terra, quem mais virá nos socorrer e empunhar a bandeira do desenvolvimento sustentável? Mesmo que os obstáculos sejam vários, saídas há. Mesmo que para isso seja preciso reinventar a política, a escola e o governo.

Como operacionalizar essas mudanças, se não temos tradição?

É verdade, não temos tradição, mas temos certeza que precisamos mudar a forma de planejar nossas políticas públicas. Não se trata de nenhum bicho de sete cabeças ou de um modelo de tal modo complexo que só a poucos se torne acessível. Para começar o planejamento participativo basta haver uma vontade política firme nesse sentido. Essa vontade política decorre da mobilização social e da existência de um espaço público em expansão. Tem a ver, portanto, com a ação da cidadania em favor dos seus direitos.

Se governantes e governados estabelecerem canais produtivos de interlocução, o planejamento participativo será uma exigência inexorável. Uma coisa é certa: se não temos tradição agora, nada impede que lutemos para conquistá-la amanhã.

O planejamento participativo, por outro lado, não é uma fórmula mágica que resolve todos os problemas da gestão pública ou que assegure a efetividade social das políticas públicas. Ele deve ser visto, sobretudo, como um mecanismo de garantia dos direitos do cidadão e de democratização da coisa pública. Por ter essa natureza é um recurso da administração pública que está em permanente transformação e jamais será um modelo acabado e definitivo. Sua eficácia decorre, sobretudo, do grau de integração que mantém com a realidade e as necessidades da comunidade, suas aspirações e desejos individuais e coletivos.

Por outro lado, se há em nosso país algo que tem merecido respeitabilidade internacional, tal cabe ao orçamento e ao planejamento participativos. O exemplo que alguns Estados e Municípios que adotam o planejamento e o orçamento participativos estão dando têm merecido de observadores estrangeiros os mais efusivos elogios pelo seu caráter inovador, configurando uma nova maneira de gerir eficazmente a administração pública, a ser seguida, inclusive, pelos países ditos desenvolvidos.

Devemos fazer tudo para que essa idéia algum dia vingue e passe a ser referência na maneira de planejar o desenvolvimento das políticas educacionais em nossas comunidades.

De que forma envolver os pais no planejamento participativo, já que não demonstram interesse nem em ir às reuniões de pais e mestres?

Com certeza não se trata de tarefa fácil. Nesse caso, a dificuldade não se restringe apenas aos pais refratários à escola. Nossas escolas, lamentavelmente, também ainda não sabem como envolver os pais e a comunidade em seu dia-a-dia. Há muitos preconceitos, de ambas as partes. Muitos professores não conseguem se comunicar com mães e pais originários das camadas populares, ou porque são muito pobres, ou porque são completamente iletrados. Sem falar na dificuldade que têm em articular objetivos curriculares, que, em geral, não se relacionam bem com a realidade circundante, com aspirações e necessidades objetivas que se encontram ausentes dos conteúdos escolares.

Podemos afirmar, por outro lado, que só terá sentido o planejamento participativo escolar na realidade atual se for para a comunidade escolar, em conjunto com a comunidade externa e a de pais em particular, reinventarem essa escola que está aí.

Talvez um dos grandes obstáculos à participação dos pais dos alunos das camadas populares seja o fato de que a escola que temos não se encontrar estruturada para essa participação. Um certo viés elitista que começa na Universidade, no momento da preparação do futuro professor, e vai até o modo como são planejadas as políticas educacionais, marcadas pelo elitismo e pela centralização em nichos privilegiados de poder.

Aparentemente, quando o Presidente da República e o Ministro da Educação decretam o Dia Nacional dos Pais na Escola parece tratar-se de algo prosaico ou, na melhor das hipóteses, redundante, pois, pelas leis em vigor, a partir da maior de todas elas, a educação não é monopólio do setor público. Sem falar nas modernas pedagogias que são incansáveis em afirmar e reafirmar o valor e o papel fundamental dos pais na vida escolar de seus filhos. Se, para levar a família à escola pública, é preciso um decreto federal para isso, algo não vai bem com a escola básica que temos hoje no Brasil.

Não podemos, por outro lado, cair no equívoco de chamar os pais para dentro das escolas e não termos o que dizer a eles e muito menos o que pedir quanto aos seus papéis na educação dos seus filhos. Chamá-los ao chão da escola só para solicitar-lhes ajuda e horas de trabalho voluntário é um erro fatal, pois acabaremos legitimando o já limitado compromisso do Estado com o pleno financiamento das políticas públicas de educação neste país.

Planejamento participativo escolar sem a participação ativa dos pais dos alunos, dos próprios alunos, do corpo docente e do quadro técnico e administrativo não pode ser assim designado. A escola que temos está aberta a este tipo de gestão? Se não está, o que podemos fazer para que tal ocorra? Sem dúvida, fica óbvio que para avançar nessa direção precisamos reinventar o mundo da escola e desconstruir o padrão de sociabilidade que nos levou a engendrar um modelo de planejamento público, que opera sem a participação pública.

Outras questões sempre presentes a balizar a atuação da UNDIME-MA: É bom ter a municipalização? Que municipalização é essa em que outros municipalizam os municípios? É bom adotar a municipalização nessas circunstâncias? Quem ganha e quem perde com ela? Não corremos o risco de diminuir o nível educacional se os gestores e administradores não seguirem essas orientações? Existe, por parte do Estado, algum mecanismo que permita avaliar essa nova maneira de conceber a educação?

Cremos que precisamos de um novo modelo de municipalização em nosso país, onde o município possa ser respeitado em suas prerrogativas de autonomia e autodeterminação. Achamos bom, sim, termos a municipalização. É o meio mais eficaz para construirmos um poder local comprometido com a qualidade de vida e com equidade social. Agora, pensar que vamos conseguir tudo isso sem mudar o modelo atual é uma santa ingenuidade. Como, na história política do nosso país, o município acabou transformando-se no elo mais fraco da corrente, não será fácil a luta por um novo pacto federativo que realmente opere em níveis de equilíbrio institucional.

Com certeza, o risco de diminuir a qualidade educacional caso os gestores municipais não sigam as orientações do planejamento participativo é grande. Muitos críticos da municipalização acham que ela é uma espécie de estratégia da classe dominante para reduzir os investimentos públicos em políticas de equidade social. Ao transferirem essa responsabilidade a um poder local debilitado e em geral despreparado, garantem mais recursos para setores produtivos rentáveis economicamente e preservam o status quo geral da sociedade, uma vez que as políticas públicas conduzidas pelos municípios tendem a ser menos eficientes e até mesmo retroativas, pelas razões estruturais já apontadas.

O volume de encargos que os municípios têm hoje em dia não permite improvisos. Mesmo que no curto prazo não implantem o planejamento participativo, de algum modo terão que buscar racionalidade técnica em suas gestões, pois, além da vigilância crescente da sociedade civil, terão que demonstrar alguma eficiência para pleitearem recursos federais e externos de um modo geral.

Reinventar a escola não é apenas uma bela metáfora pedagógica. Trata-se de um projeto instituinte que nasce das aspirações de cada sistema de educação. Reinventar a escola significa nossa mobilização em favor de uma nova escola pública que seja socialmente necessária e consiga elevar as expectativas e as esperanças do povo brasileiro e maranhense em especial.

Temos dúvidas se as elites que dominam o Estado brasileiro estão realmente comprometidas com projetos dessa natureza ou, muito menos, se dispõem de mecanismos de avaliação dessas experiências. Achamos mesmo que a reinvenção da escola será tarefa da sociedade civil organizada em íntima aliança com o mundo escolar e suas vizinhanças e não de governos que se orientam em direção oposta ao desenvolvimento sustentável da sociedade.

A politicagem atrapalha a educação?

A politicagem atrapalha a vida como um todo, não só a educação. Onde a forma do político assume tais contornos, estaremos condenando gerações ao servilismo e mesmo à exclusão social irreversível.

A UNDIME-MA cumprirá o seu papel histórico e honrará o seu mandato institucional se continuar sabendo posicionar-se como verdadeiro agente de transformação social. Para isso, é mais do que urgente, que os Dirigentes Municipais de Educação de todo o país, e do Maranhão, especialmente, não deixem de apóia-la na luta pela autosustentabilidade.


1 Assessor de Planejamento da UNDIME-MA e Diretor Estadual da ANPAE-MA

2 WAISELFISZ, J. J. et PALHANO SILVA, R. N. Perfil dos dirigentes municipais de educação. Brasília:

UNDIME: UNESCO: Fundação FORD, 2000.

3 VALLA, Victor Vincent. Verba pública. Petrópolis: Ed. Autor, 1988.

EDUCAÇÃO SEM PLANO

                                                                                  Raimundo Palhano1

(Elaborado no início do ano de 2002)

No dia 9 de janeiro de 2002, o Plano Nacional de Educação-PNE, elaborado para os próximos 10 anos, completará seu primeiro ano de vida. Pela Lei 10.172, que o aprovou, Estados e Municípios terão que desenvolver, no prazo máximo de 1 ano, em sintonia com o nacional, os seus planos educacionais. Raras, todavia, são as unidades federadas que estão dando prioridade a essa exigência. Em sua grande maioria, a defasagem  é ponderável e, em alguns Estados, como o Maranhão, ela é preocupante: a rigor, os sistemas estaduais e municipais ainda não elaboraram seus Planos Decenais de Educação nos moldes preconizados pela legislação em vigor.

À exceção de iniciativas isoladas da UNDIME, do CONSED, da ABONG, das Comissões de Educação da Câmara e do Senado, do MEC e da UNESCO, que estão articulando iniciativas nessa direção, o tema está encontrando dificuldade para entrar na ordem de prioridades dos gestores públicos da educação neste país. Em nosso Estado, louve-se apenas a iniciativa do Ministério Pública Estadual, da UNDIME Estadual e da Rede Interinstucional de Apoio à Educação Municipal, respaldada pelo UNICEF, que estão colocando o assunto em pauta e com a ênfase que a ele deve ser dada.

Há quase 70 anos o Brasil tenta conduzir sua política educacional por intermédio de um plano nacional. É uma longa história de altos e baixos, avanços e recuos. A característica marcante desse processo tem sido sua flagrante descontinuidade e inconclusividade, causadas, sobretudo, pelos efeitos negativos do jogo de interesses ligado ao controle do poder. De 1988 para cá, coincidindo com a promulgação da nova Carta Magna, a mobilização social pela reforma e por um plano da educação pública aumentou muito, reforçada pela Conferência de Jomtien, de 1990, que levou à elaboração do Plano Decenal de Educação para Todos, entre 1993-1994, culminando com a LDB de 1996, que, retomando a Conferência Mundial da Tailândia, recoloca o Plano Nacional de Educação na agenda, cuja elaboração se inicia em 1997 e vai até o início do corrente ano, quando se transforma em Lei.

O PNE, apesar de não espelhar plenamente a aspiração da sociedade civil organizada e dos vetos que recebeu, é um plano com algumas inovações no cenário brasileiro. Ele não é um plano da União, não é um plano de Governo, não é um plano de Secretaria de Educação, nem de qualquer Rede de Ensino. Ele é um plano nacional, um plano de estado e um plano global que deve refletir o projeto de educação que a sociedade brasileira aspira para seu povo. Por esse motivo, pelo que determina a Lei e pelos compromissos internacionais assumidos pelo Brasil, o PNE e os demais que dele decorrerão, terão que ser desenvolvidos por governos e sociedade civil organizada, contar com o apoio e participação decisivos dos segmentos ligados ao desenvolvimento social, além do envolvimento direto do Legislativo, do Poder Judiciário, do Ministério Público e das organizações representativas da iniciativa privada que atuam na área educacional e que, por isso, assumem responsabilidades sociais concretas.

Vejo a elaboração dos Planos Decenais do Estado do Maranhão e dos Municípios maranhenses sob duas dimensões: como responsabilidade política e histórica e como possibilidade de mudança. No primeiro caso, em função do dever cívico que têm, governo e sociedade precisam dar uma resposta contundente aos desafios colocados aos nossos sistemas educacionais públicos, cujas características centrais são os baixíssimos índices de desempenho e o consequente fracasso das nossas redes escolares. No segundo caso, a construção dos planos cria uma nova oportunidade de enfrentamento dos graves problemas que atormentam a educação pública maranhense, em seus vários níveis, modalidades e dependências administrativas, fato que deve ser encarado com a maior seriedade possível, sem o que faltarão compromissos e inspirações para a produção de novas alternativas de superação da baixa qualidade do ensino.

Em um Estado como o nosso, onde os problemas da educação básica representam um dos maiores desafios para os governantes, priorizar a elaboração dos Planos Decenais do sistema estadual e dos municípios pode ser realmente uma das saídas das mais eficazes e oportunas.

Não podemos, obviamente, continuar administrando e gerindo as políticas públicas de educação à base de iniciativas de impacto, que, por mais necessárias e oportunas que sejam, não conseguem atingir o núcleo do problema.

Precisamos, mais do que nunca, identificar e conhecer as especificidades de cada nível de ensino e modalidade de educação, bem como dos sistemas de gestão e financiamento, para, em conjunto com a sociedade civil organizada, montarmos estratégias conseqüentes de enfrentamento da situação.

É insuficiente pensar que se resolve os problemas do ensino médio apenas com a redução da taxa de defasagem idade/série, ou que se superará os baixíssimos níveis de aproveitamento dos alunos das quatro primeiras séries do ensino fundamental, ministrado em classes multisseriadas da zona rural, recorrendo a alternativas pedagógicas que, embora eivadas de qualidade, repercutem minimamente no universo maior.

Do mesmo modo, nos Municípios, a educação pública pouco avançará se eles não forem capazes de engendrarem projetos político-pedagógicos próprios, sem o que continuarão sendo, em sua grande maioria, simples executores das políticas emanadas dos outros sistemas de ensino, em especial da União.

A tradição maranhense, lamentavelmente, é a da educação sem plano próprio. Executamos, em geral, a política e a administração da educação a partir dos parâmetros,  diretrizes e prioridades externas, sejam do Banco Mundial, do MEC ou de outras agências financiadoras originárias de outros contextos. Continuar renunciando ao dever cívico de construir nossa autonomia pode até ser conveniente a muitos governantes ou adequado aos seus projetos de dominação; todavia, o preço dessa omissão será sempre a impossibilidade de vitória frente aos desafios que, dia após dia, mais se tornam causticantes e instigantes.

Creio, firmemente, que a reversão do problema educacional maranhense passa, obrigatoriamente, por uma ampla e geral convocação da sociedade e de seus setores organizados. Falo de uma convocação pra valer e de audiências horizontais, não de simulações participativas que servem apenas para construir imagens. Ou nós nos juntamos para compartilhar objetivos e metas, governo e sociedade, ou, mais uma vez, perderemos  esta mais nova oportunidade histórica que, com certeza, pode, de uma vez por todas, mobilizar forças sociais vivas com capacidade de desconstruir a catedral de fracassos que tem caracterizado a nossa educação pública nos últimos tempos.


1 Diretor Estadual da Associação Nacional de Política e Administração da Educação-ANPAE/MA

UNDIME E ANPAE NO MARANHÃO PELA EDUCAÇÃO BÁSICA

Por

 Raimundo Palhano

(Revisto em 26.09.2002)

                             A União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação-Maranhão/UNDIME-MA cresceu não só quantitativamente, mas, o que é essencial,  qualitativamente. Hoje é uma instituição reconhecida tanto pelos dirigentes municipais de educação e pela sociedade, como, igualmente, pelas instituições parceiras, onde se destacam: o Ministério Público Estadual, o Unicef, o Conselho Estadual de Educação do Maranhão, a FUNAC, a FAMEM, o Instituto do Homem e outras organizações governamentais e não-governamentais.

Uma UNDIME-MA cada vez mais forte e necessária depende de muitos fatores: primeiramente da participação efetiva dos dirigentes educacionais, do seu envolvimento e compromisso com os princípios e com a programação da entidade e também com as suas finalidades estatutárias;  depois, de sua vontade de colaborar para o desenvolvimento sustentável do órgão. Para chegar a esse ponto é preciso fazer escolhas de valor estratégico, buscar aliados que possam contribuir para atingir aquela meta substantiva.

As realidades nacional e estadual, marcadas pela crescente municipalização da educação básica, revelam, mais do que nunca, que se torna inadiável a consolidação da UNDIME, como instância efetiva de articulação dos interesses da educação pública municipal. Em uma conjuntura marcada por grandes exigências técnicas, pedagógicas e administrativas postas aos municípios, em seus papéis crescentes de gestores da política educacional, a existência de uma UNDIME forte, técnica e politicamente, representará um apoio indispensável ao sucesso das políticas de municipalização da educação preconizadas pela Constituição Federal, pela LDB e presentes nos programas dos sistemas de ensino.

Uma das formas de afirmação institucional da entidade, no seu papel de articuladora das políticas municipais de educação, decorrerá de sua capacidade de gerar, produzir e disseminar análises e argumentos técnicos e pedagógicos, bem como dados e informações que auxiliem o dirigente municipal de educação a tomar decisões e elaborar projetos de desenvolvimento próprios. Nesse sentido, a formação e capacitação de dirigentes municipais e escolares e a manutenção e desenvolvimento de dados e informações assumem pesos decisivos, pois propiciarão a criação de mecanismos efetivos de atualização e intercâmbio de informações entre as Secretarias Municipais de Educação, ao tempo em que subsidiarão a elaboração de estudos, programas e projetos a cargo das redes municipais de ensino.

No estágio atual da sociedade, nenhuma instituição, seja pública ou privada, governamental ou social, evoluirá, ou mesmo se manterá funcionando, se não dispuser de quadros técnicos competentes e de um eficaz sistema de informações. A existência de informações técnicas representa uma ferramenta básica para remover obstáculos a uma administração realmente eficiente, justamente aquela que busca atingir níveis crescentes de racionalidade, com máximo grau de qualidade social e equidade.

POLÍTICA DE ALIANÇAS


No caso específico da UNDIME-MA, a sua malha de interlocução compreende o Escritório do UNICEF, as Gerências de Desenvolvimento Humano-GDH e Desenvolvimento Social-GDS, a Fundação de Apoio à Criança e ao Adolescente-FUNAC, o Ministério Público Estadual, o Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária- CENPEC, a Federação dos Municípios-FAMEM, o Conselho Estadual de Educação, entre outros, além de órgãos não-governamentais e da sociedade civil, como o Instituto do Homem, o Sindicato dos Professores do Maranhão, entre outros.

Um parceria das mais importantes para a UNDIME-MA é a que vem sedo feita com o Ministério Público Estadual, através  do Centro de Apoio Operacional da Infância e da Juventude, a qual gira em torno da implementação do programa institucional “Educação: Direito da Criança, Dever de Todos Nós”.

O programa vem realizando várias iniciativas  marcantes, as quais têm repercutido intensamente em todo o Estado do Maranhão, principalmente pelo seu ineditismo e pelo seu conteúdo inovador, destacando-se os Encontros Regionais de Educação e o programa das Teleconferências. Contando, ainda, com a participação qualificada do Unicef, responsável pelo financiamento, e o apoio de órgãos como a FAMEM, o Conselho Estadual de Educação, a FUNAC, o Sindicato dos Professores, as Gerências Regionais, entre outros, o programa do MPE visa atingir todas as dezoito regiões administrativas do Estado. Os encontros regionais têm o objetivo de materializar consensos sobre questões como implantação de Sistemas Municipais de Ensino, Conselhos Municipais de Educação,   Controle da Evasão Escolar, Conselhos Tutelares e dos Direitos da Criança e do Adolescente, entre outros. As Teleconferências, por seu turno, cobrem todo o Maranhão e podem ser acompanhadas de qualquer parte do Brasil e mesmo do exterior.

A ALIANÇA ESTRATÉGICA ANPAE-MA/UNDIME-MA


A tarefa histórica voltada à construção de um poder educacional local democrático e autônomo no Maranhão estimula uma efetiva aliança institucional entre a UNDIME-MA e a recém instalada seção estadual da Associação Nacional de Política e Administração da Educação-ANPAE, uma das mais antigas e conceituadas associações científicas de administradores educacionais do Brasil e mesmo da América Latina.

A responsabilidade social da UNDIME-MA com a reinvenção da política pública educacional nos municípios maranhenses exige da entidade vínculos permanentes e sólidos com o meio acadêmico e com organizações promotoras do desenvolvimento científico e tecnológico da educação.

Para que a UNDIME-MA se afirme como portadora de mudanças é mais do que evidente a necessidade de que se ultrapasse a luta meramente corporativa e que se transforme numa instância capaz de formular e implementar projetos de direção no campo das políticas públicas, passando a ser também uma instância produtora de cultura na esfera das políticas públicas educacionais, tendo como referência a construção e desenvolvimento sustentável do poder local democrático.

Estando ambas localizadas na esfera da sociedade civil e fortemente identificadas e comprometidas com o desenvolvimento da educação pública de qualidade social, encontrarão grandes facilidades em estabelecerem pactos de ação e interlocução, pois estarão isentas de muitas amarras que dificultam e burocratizam as articulações interinstitucionais, principalmente quando estabelecidas com entidades do setor governamental.

Gozando ambas de mais flexibilidade para agir e formular ações conjuntas em prol do desenvolvimento da política, da gestão e da administração da educação, poderão enriquecer e fortalecer a luta mais ampla da sociedade maranhense por um sistema educacional público que não seja excludente e de segunda categoria, pelo fato de atender apenas às demandas das camadas mais pobres da sociedade.

Além do mais, a aliança fortalece um dos eixos estratégicos da seção estadual da ANPAE, que é aquele voltado à priorização da educação básica municipal como uma das linhas mestras da programação da Associação para o próximo biênio, considerando que os municípios maranhenses são responsáveis diretos pelo atendimento de 80% das vagas nesse nível de ensino.

A experiência maranhense de parceria UNDIME-ANPAE, com toda certeza, resultará em oferta de subsídios a uma aliança mais ampla, em escala nacional, entre as duas instituições, na medida em que pode representar um experimento concreto capaz de promover uma eficaz complementaridade entre prática e teoria no campo da gestão e da administração de políticas públicas educacionais. Além disso, este processo de vasos comunicantes fará avançar não só os conhecimentos, como as práticas de gestão e administração da educação, fato este importante para uma eventual reconfiguração de paradigmas históricos ligados à evolução e aos movimentos da ANPAE.

A presença da ANPAE no cotidiano da administração e da gestão da educação nos municípios brasileiros, e maranhenses em particular, ainda é muito difusa, para não dizer fraca. Se a entidade souber articular melhor a sua natureza acadêmico-científica às necessidades e demandas da educação básica em geral, no que diz respeito à administração e gestão de redes educacionais e sistemas municipais de ensino, sem sombra de dúvida atingirá novos patamares de efetividade social em sua atuação institucional.

Os gestores municipais da educação apresentam grandes lacunas em termos de preparação e capacitação para o exercício de suas funções e atribuições públicas. A estrutura e organização da UNDIME não contempla diretamente a superação de tais óbices, o que reforça a importância estratégica da aliança UNDIME-ANPAE pelo desenvolvimento sustentável e pela autonomia dos sistemas municipais de ensino em todo o Brasil.

HOMENAGEM A DAISAKU IKEDA

DISCURSO POR OCASIÃO DA CONCESSÃO DO TÍTULO DE “PESQUISADOR HONORIS CAUSA” DO INSTITUTO MARANHENSE DE ESTUDOS SOCIOECONÔMICOS E CARTOGRÁFICOS-IMESC AO SENHOR DAISAKU IKEDA, PRESIDENTE DA SOKA GAKKAI INTERNATIONAL-SGI

(Proferido por Raimundo Palhano, ex-presidente do Imesc, em São Paulo, segundo semestre de 2009)

Nada menos do que 78 anos separam o antigo Departamento Estadual de Estatística-DEE, iniciado nos anos 1930, do atual Instituto Maranhense de Estudos Socioeconômicos e Cartográficos-IMESC, autarquia vinculada ao sistema de planejamento do Estado do Maranhão.

Pesa-nos, portanto, uma responsabilidade histórica de mais de três gerações de maranhenses que buscaram edificar um espaço de estudo e pesquisa, indo das formas mais simples de coleta e compilação de dados e informações, até o panorama de hoje, marcado por análises refinadas, produção de diagnósticos globais e setoriais, indicação de propostas de políticas públicas de desenvolvimento, demarcando uma trajetória de muita luta e resistência em favor da construção de um órgão de pesquisa estadual competente e dinamizador do planejamento do desenvolvimento.

A trajetória do IMESC não estaria completa, por oportuno, sem o diálogo fecundo entre gerações, possibilitador do entrelaçamento de visões de mundo, na direção de novas formas de conhecimento, não só de base científica, mas, fundamentalmente, de cunho humanista, contribuindo assim para desenvolver sociabilidades e inteligências comprometidas com a transformação da realidade social e cultural do Estado do Maranhão.

No bojo desse processo vivencial é que o IMESC instituiu a Concessão de Títulos Honoríficos para colaboradores e pessoas relevantes ao avanço da civilização humana, com atuação local, nacional e mundial, fortalecendo assim a sua caminhada em favor do desenvolvimento humano, da ciência e da tecnologia.

O que se espera desse rico processo de afirmação institucional é que essa comunidade ampliada de pesquisa, robustecida agora com a participação e inspiração dos novos talentos que chegam, contribua efetivamente para que o IMESC honre o seu passado e, ao mesmo tempo, seja capaz de continuar, primeiramente, a pensar com ousadia; depois manter o seu espírito de luta, servindo ao povo do Maranhão e do Brasil, com honra e dignidade, como os antigos samurais, não deixando morrer sua alma inquieta e revolucionária; e, por último, que continue tendo forças para ser o audaz navegante que sempre foi, descortinando novos e lúcidos olhares sobre a condição humana e a sua evolução.

Ilustríssimos e Ilustríssimas Senhores e Senhoras,

Cumpre-nos agora dizer, de modo claro e objetivo, quais os motivos que levaram o Conselho de Administração do IMESC, em 2008, a conceder, com o máximo do seu orgulho, o título de “Pesquisador Honoris Causa” ao cidadão global e grande humanista Daisaku Ikeda.

Uma das motivações essenciais foi o fato de se tratar de um líder intelectual e espiritual detentor de uma enorme contribuição à construção do conhecimento humano, por todo o século XX e neste que se inicia, fonte de consulta obrigatória em matérias que dizem respeito aos desafios do mundo contemporâneo;

Outra razão singular para a homenagem cinge-se ao conteúdo original e inspirador das formulações de Daisaku Ikeda a respeito do desenvolvimento mundial, tendo por base os princípios da equidade, da sustentabilidade e da ecologia, os quais fundamentam uma proposta de desenvolvimento baseada na harmonia do ser, do indivíduo com os outros seres humanos e de cada um e de todos com a natureza;

Também motivou fortemente a efetivação da distinção honorífica a inestimável contribuição do Homenageado à cultura, à educação e principalmente à disseminação de uma cultura de paz para o mundo, fundamental para a superação de uma ordem mundial que ainda se estrutura, opera e reproduz sob a inspiração da violência e da guerra;

E, por fim, a comunidade científica do IMESC houve por bem homenagear ao Dr. Daisaku Ikeda por se tratar de um cidadão planetário inigualável, que honra qualquer pantheon do mundo, por suas virtudes e qualidades éticas, morais, artísticas e filosóficas, atributos estes cada vez mais raros entre os líderes internacionais e profundamente escassos na sociedade contemporânea.

Muito obrigado pela atenção e pelo carinho de todos, em especial pela acolhida amiga e fraterna, arte esta que só a rica cultura japonesa sabe fazer com beleza e perfeição.

Por uma nova cultura de harmonia e paz para o mundo!

TEXTO CIENTÍFICO SIMPLIFICADO

Repassado por Maria Lúcia de Moura Iwanow,

ex-secretária executiva da Undime Nacional, no início dos anos 2000.

Endereço eletrônico: undimenacional@undime.org.br

Página na Internet: www.undime.org.br

 

Muitos textos científicos são escritos numa linguagem de difícil
compreensão para o grande publico. Torna-se necessário traduzi-la
para torna-los mais acessíveis ou, pelo menos, para uma difusão mais
extensiva da profundidade do pensamento cientifico.
Isto pode ser feito com aplicação de um método engenhoso que
consiste na reunião de conceitos fragmentados em outros mais
abrangentes que, numa sucessão progressiva de sínteses – ou estágios –
reduzem a complexidade do texto original até o nível de compreensão
desejado.

 

Se estas colocações parecem ainda obscuras ou abstratas – o que
mostra que são cientificas – um exemplo muito simples ilustrara o
método e facultara ao leitor esperto pratica-lo em outros textos. O
exemplo que daremos a seguir é o de um texto altamente informativo em que são discerníveis elementos de Química, Física, Botânica,
Geometria e outras disciplinas.

 

Como se verificará, entretanto, essa massa de compreensão fica mais
próxima. Ao final do quinto estágio, surgira, clara e límpida, a
síntese mais refinada daquele texto, antes incompreensível, que
brilhara singela e cristalina, evidenciando a eficácia do nosso
método.

TEXTO ORIGINAL

O dissacarídeo de fórmula C12H22O11, obtido através da fervura e da
evaporação de H2O do líquido resultante da prensagem do caule da
gramínea Saccharus officinarum, Linneu, isento de qualquer outro tipo
de processamento suplementar que elimine suas impurezas, quando
apresentado sob a forma geométrica de sólidos de reduzidas dimensões
e arestas retilíneas, configurando pirâmides truncadas de base
oblonga e pequena altura, uma vez submetido a um toque no órgão do
paladar de quem se disponha a um teste organoliptico, impressiona favoravelmente as papilas gustativas, sugerindo a impressão sensorial equivalente provocada pelo mesmo dissacarídeo em estado bruto que ocorre no líquido nutritivo da alta viscosidade, produzindo nos órgãos
especiais existentes na Apis mellifica, Linneu. No entanto, é
possível comprovar experimentalmente que esse dissacarídeo, no estado físico-químico descrito e apresentado sob aquela forma geométrica, apresenta considerável resistência a modificar apreciavelmente suas dimensões quando submetido a tensões mecânicas de compressão ao longo do seu eixo em conseqüência da pequena deformidade que lhe é peculiar.

PRIMEIRO ESTÁGIO

A sacarose extraída da cana de açúcar, que ainda não tenha passado
pelo processo de purificação e refino, apresentando-se sob a forma de
pequenos sólidos tronco-piramidais de base retangular, impressiona
agradavelmente ao paladar, lembrando a sensação provocada pela mesma  sacarose produzida pelas abelhas em um peculiar líquido espesso e nutritivo. Entretanto, não altera suas dimensões lineares ou suas proporções quando submetida a uma tensão axial em conseqüência da aplicação de compressões equivalentes e opostas.

SEGUNDO ESTÁGIO

O açúcar, quando ainda não submetido à refinação e, apresentando-se
em blocos sólidos de pequenas dimensões e forma tronco-piramidal, tem sabor deleitável da secreção alimentar das abelhas, todavia não muda suas proporções quando sujeito à compressão.

TERCEIRO ESTÁGIO

Açúcar não refinado, sob a forma de pequenos blocos, tem o sabor
agradável do mel. Porém não muda de forma quando pressionado.

QUARTO ESTÁGIO

Açúcar mascavo em tijolinhos tem o sabor adocicado, mas não é macio
ou flexível.

QUINTO ESTÁGIO

Rapadura é doce, mas não é mole.